16 de mai. de 2013

O maior piloto de Fórmula 1 que você nunca viu


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Antes de se tornar uma lenda da Fórmula 1, Ayrton Senna teve um rival em potencial chamado Tommy Byrne, um cara que alguns entendidos do hemisfério norte consideravam tão bom quanto ele. Esta é a história de como a única chance de Byrne no alto escalão da Fórmula 1 acabou misteriosamente.

Em seu livro “Crashed and Byrned”, Byrne escreve sobre sua ascensão através dos baixos escalões do automobilismo europeu, impulsionada por talento, arrogância e a ocasional capacidade irlandesa de manter-se bêbado. Incapaz de fazer seu caminho de modo tão sadio quanto Senna, Byrne entrou no círculo de campeões da Fórmula 3 e, em 1982, teve uma chance de fazer um teste na McLaren depois de cinco decepcionantes corridas pela obscura Theodore.
O problema? Byrne acredita que acabou insultando Ron Dennis, então chefe da McLaren, quando recusou uma proposta anterior para ser piloto de testes. Somente uma performance estelar no teste de Silverstone poderia corrigir a trajetória de sua carreira.
Eu estava lá com outros quatro pretendentes: Thierry Boutsen, Stefan Johansson, Quique Mansilla e Dave Scott. Havia saído com um amigo na noite anterior. Pegamos umas garotas e levamos elas ao teste, o que provavelmente criou uma impressão ruim. Quero dizer, a minha parecia uma puta. Ela não era, mas usava muita maquiagem e uma saia que mal cobria sua bunda.
Este era o teste que todos falam quando meu nome é mencionado. Eles sabem tudo sobre ele — como eu disse a Ron Dennis que o carro era uma merda, como eu ferrei minha carreira por ser metido demais. Mas eles não sabem nada, porque nada disso é verdade. Ron Dennis sequer estava no teste! O teste foi comandado por Tyler Alexander. Johansson havia pilotado no dia anteror, quando estava um pouco úmido, então não podemos comparar os tempos. Scott e Mansilla fizeram suas voltas no terceiro dia e Boutsen e eu no segundo. No dia do meu teste, Boutsen foi primeiro. Ele fez umas quinze voltas, voltou e reclamou de subesterço. Ele pegou um novo jogo de pneus, voltou à pista e fez em 1:10.9. Tudo de modo muito profissional. Os mecânicos da McLaren começaram a instalar meus pedais, que eu havia feito quando visitei a fábrica da McLaren na semana anterior. Eles nos deram nossos próprios pedais, cada um com nossos nomes gravados. Quando fazíamos nossas voltas, eles colocavam o nome na lateral do carro. Havia muita atenção aos detalhes.
Enquanto isso eu estava um pouco nervoso. Senti muita ansiedade nesse teste. Era a única oportunidade para reparar o estrago que eu havia feito antes em minha relação com Ron Dennis. Mas ali estava Boutsen reclamando de subesterço, e ele era um cara que eu respeitava. Assim que entrei no carro, minhas preocupações se foram completamente. Sim, havia algum subesterço, mas tudo o que fiz foi frear um pouco antes, virar um pouco antes e antecipar a aceleração. O resultado: nenhum subesterço. O carro era incrivelmente bom. Eu estava fazendo curvas em quarta que na Theodore eu faria em terceira e que Boutsen aparentemente fez em terceira também. Logo depois da segunda volta senti que precisaria subir uma marcha. Estava quase no limite da quarta na Stowe, o que era incrível. Na Theodore eu sequer havia chegado ao fim da terceira.
Assim que peguei os pneus antigos, fui tão rápido quanto Boutsen com seus pneus novos! Depois eles instalaram meu novo jogo. Aí sim eu fiquei empolgado! Eu estava quatro segundos por volta mais rápido que na Theodore. Subtraia quatro segundos das voltas da Theodore nos GPs e eu estaria na frente de todos. Deram minhas três últimas voltas como 1:10.01, 1:10.01 e 1:10.01. Meu amigo Joey Greenan estava lá, cronometrando por conta própria, e ele estava convencido de que minhas duas últimas voltas foram ainda mais rápidas, mas por alguma razão não me mostraram os tempos. Joey cronometrou 1:09.6 em minha última volta com pneus de corrida, não de classificação.
Para mim, isso era a simples confirmação do que eu suspeitava há tempos. Pilotando um carro de F1, não era mais difícil ser tão competitivo como em um bom FF1600 de um carro de F3. Se eu entrasse em um bom carro, independentemente da categoria, seria bom o bastante para vencer. Este teste apenas confirmou isso. Se eu tivesse minha estreia em GPs com um McLaren ou um Williams, poderia estar em condições de ganhar imediatamente. Não há mistério. Vinte e cinco anos atrás eu era o melhor piloto lá. As pessoas ficaram impressionadas com os tempos que eu fiz na McLaren, mas eu não estava. Era normal, foi o registro de tudo o que eu faria se tivesse um carro competitivo.


Eu disse à equipe algo depreciativo sobre o carro? Claro que não. Era um carro fantástico. Eu devo ter dito algo como “sim, há um leve subesterço em curvas de baixa mas se conseguirmos corrigir isso eu poderei ir mais rápido”, apenas como feedback. Eles me agradeceram pelo teste e fui para casa.
E esperei. O telefone não tocou. Não houve mensagem de Ron Dennis. Então o Motoring News saiu na semana seguinte e havia uma reportagem do teste que era um pouco decepcionante e dizia que minha “postura arrogante” não havia deixado boa impressão para a diretoria. E naquele momento, todos os pensamentos que eu tinha sobre meu desempenho no teste ter mudado minhas chances com a McLaren se foram.
Há cerca de seis anos eu estava no pitlane no Road America quando um cara me parou. Eu o reconheci de algum lugar. Ele disse “olá, Tommy, como você está e o que você tem feito todos esses anos?”
“Ah, apenas dando aulas e treinos”, eu disse. “É, você foi tão rápido naquele dia em que testou a McLaren, e você nem estava com o melhor carro.”
“O que você está falando?”, perguntei. Eu tinha o mesmo carro que Boutsen, que havia acabado de sair dele.
“Sim”, ele disse, “mas quando eu estava trocando seus pedais, me mandaram não te dar aceleração total.” Isso me deixou pensando: será verdade? Isso explica por que comecei usando a quarta marcha, em vez da terceira – e é provavelmente por isso que eu estava quase no limite na Stowe, por isso que o carro se aproximava da curva tão devagar. Mas tenho certeza que a McLaren nunca havia feito algo como aquilo – ou haviam me dado os tempos errados. Eles são profissionais demais. E por que alguém daria bola para Tommy Byrne? Eu preferiria não ter encontrado Tony Vandunger naquele dia, porque lembrei de todo aquele teste e minhas sensações sobre ele reacenderam.
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Então vamos perguntar ao próprio Vandunger o que ele lembra daquele dia. “Bem, foi há muito tempo! Mas sim, minha lembrança é de que fomos instruídos para dar a Tommy menos que aceleração total – e somente a Tommy, não aos outros. Por que isso? Honestamente não acredito que tenha sido para ferrar Tommy, mas para proteger ele e o carro. Lembro de ter falado com ele no GP da Áustria, quando estava pilotando a Theodore, e parecia como se estivesse em um teste da McLaren. Ele era bem metido, totalmente confiante sobre ir para a McLaren. E no teste foi igual. Acho que havia uma sensação, provavelmente de Tyler Alexander, de que aquela confiança o deixaria mais propenso a bater o carro. Não era um carro de exibição, mas sim um carro usado nas corridas, e destruí-lo não seria nada bom. Sentimos que os outros caras não eram tão agressivos, mas com Tommy ficamos preocupados principalmente por ele andar depois de Boutsen, pois teria um tempo para baixar, então mexemos um pouco no carro. Você só precisa ajustar o curso do acelerador avançando o batente do pedal. Depois você olha pelas cornetas do motor, as borboletas não estão totalmente abertas. Leva apenas uns poucos segundos. Ele foi muito rápido apesar disso, e nós rimos muito imaginando como seria sem a “sabotagem”.
Tommy era um daqueles pilotos superconfiantes e agressivos que vão para a pista e dão tudo de si. Depois há a questão dos tempos de volta. Os 1:10.01 que mostraram no painel foi super impressionante. Mas duas testemunhas que estavam assistindo tudo de perto, Joey Greenan e John Uprichard, dois irlandeses que foram assistir o teste de Tommy, estão certos de que ele estava virando mais rápido que aquilo. “John estava trabalhando para a Van Diemen e fomos até lá com o caminhão da fábrica”, diz Greenan. John estava apenas cronometrando Tommy com seu relógio de pulso, e os tempos pareciam não bater com o que estavam colocando no painel. Então ele me enviou de volta ao caminhão para pegar o cronômetro. Comecei a cronometrá-lo e ele estava cerca de um segundo mais rápido do que estavam mostrando. Perguntei para a equipe por que eles não estavam mostrando os tempos corretos. No fim ele estava em 1:09. Suas três últimas voltas foram 1:09.9, 1:09.7 e 1:09.6.”
Mesmo se pegarmos os tempos oficiais, isto foi o mais rápido que o McLaren MP4/1 — de efeito solo — já andou em Silverstone, com uma margem substancial. O ar fresco do outono teria contribuído para tempos mais baixos que o ar quente da metade da temporada, no verão de julho. O motor aspiraria mais oxigênio, talvez a equipe tenha instalado relações maiores de marcha no carro para proteger o motor durante o teste e, consequentemente fez o ajuste perfeito para melhorar o desempenho do motor, o que ajudaria a explicar os tempos. Mas o que não ajuda é o fato de ele não ter tido abertura total da borboleta. Apesar disso, como diz Watson, não importa como você tenta explicar, ou qual versão dos acontecimentos você conhece, ainda é uma performance sensacional.
“Sim. Tommy foi sensacional naquele dia”, diz Greenan. “Mas repito: não foi nada além do que eu esperava. Thierry Boutsen era um bom piloto, mas ele não era Tommy Byrne. Em termos de talento Tommy era um Ayrton Senna. Se Ron Dennin tivesse contratado-o, eu não tenho dúvidas de que ele seria várias vezes campeão.”
O próprio Dennis relembra de Tommy de forma que, 25 anos depois, soa com algum afeto:
“O bom e velho Tommy Byrne. Que personalidade e que talento! Acho que a maioria das pessoas que viram esse cara correr concorda que ele tinha tudo, em termos de controle do carro, para chegar ao topo. Mas talvez ele precisasse de outros ingredientes indispensáveis, como uma ferrenha determinação, foco e ambição. Como resultado, a carreira de Tommy deve ser vista como um fracasso – se ficarmos no contexto de sua considerável habilidade natural. Ele venceu o campeonato britânico de F3 muito bem em 1982 e fez os testes para a McLaren no final daquele ano. Ele era veloz — e seu indubitável talento casava com os requisitos para ser um piloto de ponta, ele poderia ter sido um grande piloto e eu ficaria orgulhoso se tivesse sido pela McLaren. Infelizmente, não era para ser. ”
Seja como for, o que aconteceu naquele dia de outubro de 1982, veio definir a vida de Tommy. Foi o momento em que seu destino pegou o caminho alternativo ao dos prêmios reluzentes, da fama e da glória. Ao reconhecer o momento, ele deve ter feito uma auto-profecia. Isso o atingiu duramente. É difícil não pensar que ele nunca mais seria o mesmo.
Depois do teste Byrne saiu da F1 e foi para a Indy Lights e outras categorias, incluindo o inglório treinamento do ex-bateirista do Motley Crue, Vince Neil. Agora como instrutor no circuito Mid-Ohio, ele fez sua primeira corrida em sete anos no mês passado, terminando em segundo num enduro de seis horas.

Republicado do livro “Crashed & Byrned: The Greatest Driver You Never Saw”, de Tommy Byrne e Mark Huhges.
Flashback Jalopnik é a reedição dos melhores posts do site. Este post foi publicado originalmente em 10 de novembro de 2010 e foi integralmente atualizado e editado.

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