8 de abr. de 2011

Como os aviões detectam e atacam veículos na guerra moderna?



Enquanto os rebeldes líbios continuam a luta para retomar as principais cidades do país, as forças da coalizão permanecessem limitadas a atuar em ataques aéreos contra as tropas mecanizadas e os blindados de Kadaffi. Mas como é possível atingir de forma precisa e segura alvos móveis a quilômetros de distância?
Os primeiros caçadores de tanques surgiram na Segunda Guerra Mundial.
Os Ju-87 Stuka do lado alemão empregavam táticas de bombardeio em mergulho, e dominaram o início do conflito. Depois, os IL-2 Sturmovik russos e os Typhoon ingleses passaram a confiar na potência de seus canhões de grosso calibre em vôo rasante para pôr fora de combate os Panzers do inimigo.

Com o surgimento da Guerra Fria, o cenário para um combate entre aviões e blindados passou a ser um só: a invasão do centro da Europa pelas forças comunistas do Pacto de Varsóvia. Nesse contexto, os Exércitos da OTAN estariam invariavelmente sob inferioridade numérica ante dezenas de milhares de tanques, blindados e canhões da artilharia soviética. Aviões lentos e pesados capazes de caçar calmamente veículos inimigos seriam um atestado de suicídio num céu dominado por aviões, radares e mísseis hostis. A solução, para a OTAN, foi o aperfeiçoamento de aviões de ataque talhados para missões de apoio em altitudes abaixo da cobertura de radar, como o A-10 Warthog e o Harrier, e o surgimento dos helicópteros antitanque capazes de aproveitar as características do terreno para se esconderem. Eles serviriam como multiplicadores das forças terrestres, e seriam materializados na forma dos famosos AH-1 Cobra e AH-64 Apache americanos.

Em 1989, porém, a Guerra Fria acabou. Dois anos depois, a primeira Guerra do Golfo iria alterar radicalmente todos os procedimentos e táticas das potências ocidentais. Logo nos primeiros dias da operação Desert Storm, a Força Aérea Iraquiana foi posta fora de combate, e seus radares e mísseis antiaéreos deixaram de funcionar. A superioridade aérea total, inimaginável num confronto com os soviéticos, permitiria aos aliados atacarem as poderosas Divisões Blindadas iraquianas bem do alto, evitando vôos a baixas altitudes em campo aberto, onde até um fuzil 7,62 pode acabar sendo fatal.

O problema é que todas as armas antitanque à disposição de americanos, ingleses, franceses e árabes haviam sido desenvolvidas justamente para lançamentos à baixa altitude. Acima do teto planejado de operação, elas perdiam alcance e principalmente precisão. Num misto de sorte e oportunidade, o principal vetor antitanque acabou sendo o F-111 Aardvark, um avião de ataque veloz e pesado, feito para atacar os alvos estratégicos mais bem-defendidos, e que jamais havia sequer treinado para combater pequenos veículos blindados.

Ocorre que o F-111 era um dos poucos aviões capazes de utilizar bombas guiadas (no caso, bombas guiadas a laser) com seu próprio casulo designador, o Pave Tack – a esfera no ventre do F-111 acima. Este sensor possuía câmeras infravermelhas capazes de detectar o calor dos alvos, e um emissor de laser cuja função é marcar alvos até que as bombas guiadas pelo reflexo desse raio atinjam seu destino. No início da campanha, oficiais da USAF perceberam que o Pave Tack conseguia identificar tanques iraquianos parcialmente enterrados no meio do deserto, mesmo de noite, pois a temperatura da areia caía mais rápido que a temperatura do metal.

Na primeira missão real, dois F-111 voando à média altura com pods Pave Tack soltaram oito bombas GBU-12 Paveway. Sete blindados foram atingidos. Imediatamente os bombardeiros foram retirados das funções estratégicas para assumir a tarefa conhecida como tank plinking. O general americano Norman Schwarzkopf planejava destruir ou inutilizar 50% do Exército Iraquiano com ataques aéreos, antes que a invasão terrestre começasse de fato. Resultado: ao longo da campanha, uma única ala de F-111 foi responsável pela destruição de inacreditáveis 920 (você leu certo) blindados iraquianos. A batalha terrestre da Desert Storm acabaria sendo um passeio para os aliados.

Terminados os combates, a USAF e as outras Forças Aéreas envolvidas perceberam que, além de disseminar a utilização de armas ar-solo guiadas, era preciso criar bombas menores e mais flexíveis. Os mísseis Maverick guiados por infravermelho ou TV que equipavam os A-10 eram caros demais e de operação complicada, os mísseis TOW e Hellfire foram desenvolvidos para helicópteros atacando a baixa altura, e as GBU-12 Paveway utilizadas pelos F-111 eram bombas de 227 kg, peso muito maior que o necessário para a maioria das missões.
Ao longo da década de 90, uma nova tecnologia de guiamento se popularizou: o GPS, baseado no posicionamento global por satélites, e capaz de uma precisão de poucos metros mesmo em áreas urbanas: basta saber as coordenadas do alvo. As bombas JDAM americanas seriam largamente empregadas em Kosovo e na Bósnia. Combinado a um sistema de navegação inercial, o GPS faz a triangulação entre a posição exata da aeronave lançadora, a localização do alvo e a análise de acelerômetros e giroscópios do artefato, e permite que bombas e mísseis sejam guiados em quaisquer condições atmosféricas, ao contrário do laser, prejudicado por nuvens, fumaça ou neblina. Outro armamento que surgiu com guiamento combinado GPS/inercial foi a SDB (Small Diameter Bomb), uma bomba com metade do peso da GBU-12, ideal para evitar danos colaterais.

O problema é que, para acertar comboios em movimento, tanto a JDAM quanto a SDB precisariam estabelecer um elo de dados (datalink) com algum radar ou sensor externo para receber informações atualizadas sobre a posição do alvo. Isso já foi testado, e funciona, mas custaria bem caro. Uma solução mais simples e efetiva foi a instalação das conhecidas cabeças buscadora de laser e infravermelho para a guiagem terminal de precisão nas chamadas LJDAM e SDB II desenvolvidas nos últimos anos.
No Afeganistão e no Iraque, ao longo da década de 2000, a oposição de blindados foi relativamente pequena, e os ataques aéreos geralmente consistiram em aeronaves e helicópteros voando em apoio aproximado, conforme as solicitações dos combatentes em terra. Na Líbia, pelo menos por enquanto, não há forças terrestres aliadas, mas assim como no Iraque a superioridade aérea já é total. Os ataques a comboios e concentração de tropas também estão sendo feitos à média altura, a uma distância segura do fogo de metralhadoras e canhões antiaéreos inimigos. Os caças americanos utilizam bombas a laser da série Paveway e JDAM em quantidades maciças, e nada os impede de testarem em combate os protótipos funcionais das LJDAM e SDB II.

Outra arma que pode estar sendo empregada é a bomba de cacho CBU-97. Apesar de não-guiada, ela se desmonta no ar e libera 40 pequenos projéteis com sensores chamados de skeets. Os skeets cobrem uma área de 460 por 150 metros, e quando detectam alvos blindados, disparam seus foguetes rumo ao solo. A simples carga cinética desses projéteis é capaz de destruir um tanque em sua zona mais vulnerável: o teto. Já os skeets que não detectam nenhum alvo desativam sua espoleta automaticamente.

A detecção dos blindados líbios pode ser feita de quatro maneiras. A primeira são os operadores em terra que marcam os alvos com seus designadores lasers. Oficialmente, não há esse tipo de operação na Líbia. A segunda maneira é através de casulos designadores com sensores óticos, IR e laser, levados a bordo de caças a jato e operados por um segundo tripulante. É um sistema eficiente e tradicional, mas que possui limitações, como a exigência de aviões bipostos e a necessidade de tempo limpo, sem nuvens ou fumaça.

Os radares que equipam os F-15E, F-16C e F/A-18E também podem rastrear alvos terrestres em movimento em quaisquer condições climáticas, mas esta não é a função primordial dos vetores de armas, principalmente quando estão disponíveis os grandes jatos Boeing E-8 JSTARS, equipados com radares de alta resolução capazes não apenas de mapear um grande pedaço de terra, como também monitorar os alvos móveis considerados hostis e destinar cada um deles a determinado avião presente na zona de combate. A Grã-Bretanha também possui aviões Nimrod e Sentinel projetados para a mesma função operando no local. Abaixo, a impressionante imagem de radar gerada pelo E-8 JSTARS, sobreposta a uma foto áérea digitalizada.

Do lado inglês, os Tornado GR4 da Royal Air Force estão utilizando um novo míssil compacto do tipo fire and forget chamado Brimstone. Ele foi desenvolvido especialmente para atacar alvos móveis, e foi baseado no Hellfire, famoso pelo uso no helicóptero Apache. Ao contrário do Hellfire, o Brimstone substituiu a cabeça de busca a laser por um pequeno radar de ondas milimétricas de alta precisão. Especialistas acreditam tratar-se do melhor de todos os artefatos antitanque, pois não depende da reflexão do laser (impreciso em condições climáticas adversas), nem da recepção GPS (sujeita a falhas e contramedidas eletrônicas, incluindo a desativação dos satélites que lhe dão cobertura), nem de qualquer datalink.

No vídeo acima, um Tornado GR4 em missão na Líbia carrega no ventre duas bombas guiadas a laser do lado direito, um casulo de marcação de alvos e três mísseis Brimstone em um suporte triplo, atrás do casulo, além de tanques de combustível e pods de contramedidas eletrônicas nas asas. Dá para perceber claramente o quanto o Brimstone ocupa menos espaço que as bombas Paveway. Abaixo, o resultado prático dessas missões.



















Italianos voam de Tornado, holandeses, dinamarqueses e vários países árabes usam o F-16, mas há uma máxima no mercado de equipamentos militares que diz que a França só aceita fazer as coisas do seu jeito. Ao contrário do que ocorre no resto do mundo, o Dassault Rafale, caça bimotor que está sendo insistentemente oferecido para reequipar a Força Aérea Brasileira, possui armamentos desenvolvidos especificamente para ele e seus compadres franceses. É o caso da série de mísseis AASM, com tamanhos entre 125 a 1000 kg, e opções de guiagem por GPS/inercial, infravermelho ou laser. Na teoria, apenas os dois últimos sensores permitem ataques a alvos móveis, e foram eles os responsáveis por destruir um tanque líbio a 55 km de distância, e um jato Soko G-2 Galeb que acabara de pousar, além de várias outras aeronaves e blindados.

Dois dos concorrentes principais do Rafale no mercado mundial de caças devem fazer sua estréia em missões ar-solo nos próximos dias: o Saab Gripen sueco e o Eurofighter Typhoon produzido por um consórcio europeu encabeçado por Inglaterra, Alemanha, Itália e Espanha.
Como já deu para perceber, mais do que uma ação humanitária para livrar o povo líbio da ditadura de Kadaffi, o que está ocorrendo na Líbia nesse momento é uma exibição do que os mais modernos armamentos ocidentais podem fazer num teatro de guerra real, contra um inimigo de tamanho considerável, mas incapaz de fazer frente a toda essa tecnologia. É tudo business, no final das contas.
Fonte: jalopnik
Disponível no(a):http://www.jalopnik.com.br

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