10 de jul. de 2013

F-1:O último contrato de Senna com a Lotus na íntegra



Ayrton Senna, durante o GP do Brasil de 1987, com a LotusAyrton Senna, durante o GP do Brasil de 1987, com a Lotus
 
A internet não para de nos surpreender ao expandir horizontes e proporcionar coisas inimagináveis quando se trata de mundo real. Você, douto leitor, que está aí navegando pele rede, responda: quando, na sua vida, você achou que teria oportunidade de ler a íntegra de um contrato de Ayrton Senna com uma equipe de F1? Pois é, nem eu.

Pois você terá essa chance agora. Por indicação de um leitor, o jornalista Fábio Seixas encontrou o último acordo formal entre o piloto brasileiro e a equipe Lotus, válido para as temporadas de 1987 e 1988 da F1. O arquivo foi publicado pelo Legacy Tobacco Documents Library, site mantido pela Universidade da Califórnia e que agrupa uma série de documentos históricos relacionados à indústria de cigarros. Como se sabe, a equipe inglesa, naquela época, passou a ser patrocinada pela JR Reynolds, companhia dona da marca Camel.


Conforme Seixas pontua em seu texto, há vários pontos interessantes a serem destacados. O contrato é datado de 1º de janeiro de 87 e assinado por um advogado do futuro tricampeão, que tinha procuração para tal. As partes envolvidas são a Team Lotus International Limited e a Ayrton Senna da Silva Promotions, empresa criada por ele e com sede em Nassau, nas Bahamas, um paraíso fiscal (fugindo dos impostos brasileiros, hein?).
A validade era até o fim daquele ano, com a opção, conforme previsto no artigo 9.2, de renovação até o dia 31 de dezembro de 1988. Também já estava estipulada uma data para rescisão sem pagamento de multas: 8 de agosto de 87. Curiosamente, um dia depois, 9 de agosto, o nome de Senna já estava sendo vinculado à McLaren, no GP da Hungria. Como as partes estavam proibidas de negociar com terceiros antes desse período, pressupõe-se que Ayrton descumpriu o acordo ao iniciar as conversas com a concorrente de Ron Dennis anteriormente.
Como obrigações por parte do piloto, estão o direito exclusivo da Lotus em explorar seu “nome e fama”, o comprometimento de se mudar da Inglaterra por questões fiscais (por isso, ele foi morar em Mônaco), e a garantia de participar de todos os eventos solicitados por patrocinadores da equipe (Elf, Camel e Honda), desde que avisado com dez dias de antecedência. Senna só não era obrigado a participar de propagandas de cigarro.
Ayrton Senna e Nelson Piquet no pódio do GP dos EUA de 87: por contrato, Senna passou a temporada inteira sem usar o famoso boné do Banco Nacional
Senna e Nelson Piquet no pódio do GP dos EUA de 87: por contrato, Ayrton passou a temporada inteira sem usar o famoso boné do Banco Nacional
Além disso, ele ficou proibido de usar bonés com patrocinadores pessoais (como sempre fez na McLaren, em relação ao Banco Nacional), tendo sempre de vestir bonés com as marcas escolhidas pela própria equipe (nas cerimônias de pódio, seria sempre o da Goodyear). O contrato também o restringia de praticar três específicas modalidades esportivas – motociclismo, esqui e de asa delta -, e o comprometia a “manter um padrão físico que comensure com as demandas físicas cobertas pelas atividades deste acordo durante tempo integral”.
Em contrapartida, o time lhe pagou um salário total de US$ 1,5 milhão (R$ 3,4 milhões) naquela temporada, com previsão de aumento para US$ 1,65 milhão caso a opção de renovação fosse acionada. Havia ainda um bônus de US$ 4 mil por ponto marcado (o que justificaria a campanha consistente do brasileiro, que deixou de partir para o “tudo ou nada”, como fazia em anos anteriores. Ao longo do ano, ele anotou 57 pontos, ficando em terceiro lugar no Mundial de Pilotos e recebendo US$ 228 mil extras por isso). Para 88, a cifra seria aumentada para US$ 5 mil por ponto. Caso fosse campeão, Senna também seria contemplado com outra bonificação, de US$ 250 mil.
Senna ao lado de seu companheiro de Lotus em 87, Satoru Nakajima: o acordo do brasileiro garantia a ele tratamento de primeiro piloto
Senna ao lado de seu companheiro de Lotus em 87, Satoru Nakajima: o acordo do brasileiro garantia a ele tratamento de primeiro piloto
A Lotus também custeou US$ 40 mil para bancar as despesas de Ayrton com viagem e estadia durante as 16 etapas de 87, e firmou um seguro de vida para o piloto no valor de 50 mil libras (corrigido, o valor ficaria próximo a 100 mil libras atualmente, ou R$ 335 mil). Ainda, havia uma cláusula que previa a divisão de prêmios extras oferecidos pelos promotores de corrida, em 45% para cada parte. Os demais 10% iam para os mecânicos. Senna era liberado a estampar patrocinadores pessoais em seu capacete e macacão e, por fim, a equipe possuía prioridade sobre os troféus, mas aceitava dividi-los em 50% para cada lado.
A mais interessante das cláusulas, contudo, talvez seja a 4.3, que estabelece o seguinte: “[A Lotus se compromete a] usar seus maiores esforços para garantir que os carros oferecidos ao piloto [Senna] sejam sempre o mais semelhante possível daqueles oferecidos para qualquer outro piloto da Lotus na F1. Durante 1987 e 1988, o status do piloto [Senna] será o de número 1 e o piloto vai receber a correspondente prioridade (se aplicável) na alocação de equipamentos durante 1987 e 1988″. Ou seja: como qualquer piloto com ambições fortes (Schumacher, Prost ou Alonso), Senna também se resguardava contratualmente de sua posição dentro do time.
A interessante cláusula 4.3 do contrato
A interessante cláusula 4.3 do contrato
Há outra informação importante: o contrato garantia a presença da Honda como fornecedora de motores somente até o fim de 87. Dessa forma, essa incerteza sobre a permanência ou não dos propulsores japoneses provavelmente teve peso na escolha de Senna para se mudar à McLaren, levando consigo os nipônicos. Isso, claro, aliado ao ainda mais gordo salário que passou a receber em Woking, que só não foi maior porque Dennis ganhou um cara ou coroa e pôde pagar o salário que a equipe queria, não aquele que o brasileiro exigia. A Honda só seguiu com a Lotus em 88 por conta do ingresso de Nelson Piquet.
Para ler o contrato na íntegra, em inglês, clique aqui.

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