18 de fev. de 2012

História - Como o designer mais famoso de sua época remeteu um carro conceito por correio peça por peça



Henry Ford pode ter popularizado o carro americano, mas foi o lendário projetista Harley Earl da GM quem os tornou atraentes com seus conceitos. Um destes carros – o Oldsmobile F-88 – era tão bonito que Earl encaixotou todo o conceito e o despachou para seu amigo e ex-concorrente.
O que um conceito da Oldsmobile tem em comum com o Cadillac de certa música de Johnny Cash? Os dois saíram da fábrica peça por peça.

Hoje o conceito Oldsmobile F-88 de 1954 – que fora estrela dos Motoramas da GM – repousa discretamente sobre uma plataforma giratória no Gateway Auto Museum, no Colorado. É a jóia-da-coroa do museu, e seu último preço de compra foi de atordoantes 3,24 milhões de dólares. E é fácil entender por quê.
John Hendricks, fundador do Discovery Channel e proprietário do museu, comprou o único remanescente de dois exemplares do F-88 por um preço recorde no leilão de clássicos da Barrett-Jackson em 2005.
Como ele chegou ao leilão é uma história digna de roteiro de cinema – o que não surpreende, considerando as fortes conexões de Harley Earl com Hollywood. Muitas características marcantes dos automóveis modernos – e produtos eletrônicos – vieram das inovações de Harley Earl: modelagem em argila, salões do automóvel, obsolescência planejada, carro conceito.
Em 1950, quando a GM ainda dominava os EUA, Earl estava no auge de uma grande carreira. Junto com Alfred P. Sloan, CEO da GM, o ex-construtor de carros de Hollywood pegou a visão prática, porém indigesta, de um país coberto de veículos negros e a virou do avesso.
“Se você perguntasse a qualquer um quem era quem na indústria automotiva, eles diriam que Harley era a figura dominante na GM na época” – diz Richard Earl, historiador automotivo e neto de Harley.
Earl tinha um olhar clínico para a estética, e injetou curvas arrebatadoras e ornamentos ousados a objetos que até então não passavam de meras ferramentas para locomoção. Ao conquistar a atenção de Lawrence Fisher, encarroçador da Cadillac, Earl acabou projetando o LaSalle 1927. A resistência à arte por parte de alguns executivos conservadores logo desapareceu à medida em que Sloan abraçou o estilo extravagante de Earl, encarregando o da nova Seção de Arte e Cores da GM.
Uma década depois a equipe de Earl criou o primeiro conceito do mundo, o Buick Y-Job de 1938. Dez anos depois, os carros conceito faziam parte das crescentes Motoramas da GM, que foram as precursoras dos atuais salões do automóvel. Earl estava com tudo, e seu reinado era adornado por bicos espaciais, barbatanas cada vez maiores, cromados em forma de bala, saliências envidraçadas e grades brilhantes.

Junto a uma série de Firebirds inspirados em foguetes, Buicks espaciais e o hoje famoso Chevrolet Corvette, o F-88 teve seu papel como o último dos “carros dos sonhos” da GM. Construído sobre o chassi do Corvette, o F-88 recebeu o novo V8 Oldsmobile Rocket de 324 polegadas cúbicas (5,3 litros), combinado com uma transmissão Hydra-Matic de quatro marchas e um diferencial de deslizamento limitado de relação 3,55:1 do Corvette. Os engenheiros da GM gastaram muito tempo na configuração do motor, mas acabaram chegando a respeitáveis 250 cv – nada mal para um carro de fibra de vidro relativamente leve nos anos 50.
No Gateway Auto Museum é possível ver o F-88 ao lado do Corvette 1958 – as semelhanças são impressionantes. Mas o Corvette não tem a característica grade “boca de bagre” da Oldsmobile, nem as pontudas barbatanas espaciais ou o teto rígido retrátil do F-88.
De acordo com os documentos disponíveis no GM Heritage Center, em Michigan, o carro entrecruzou o condado para apresentações promocionais depois da Motorama de 1954 no Hotel Waldorf Astoria em Nova Iorque. Durante esses anos ele foi pintado, repintado, teve sua pintura removida e foi repintado novamente e remontado peça por peça.

Em um dia ele poderia ser branco para um evento dos Shriners, no outro, era restaurado seu tom dourado original. Eixos, acabamento interno, descansos de braço e sistemas de escape foram e voltaram. Uma ordem exige o carburador Rochester do carro. Outra pede aos engenheiros que instalem um coletor de seis borboletas. Os registros também contam que um segundo F-88 – vermelho – existiu para uso pessoal de Earl. O que aconteceu com ele é um mistério. A história mais conhecida é que ele pegou fogo, mas pode ter acabado em um triturador, também.
Christo Datini, arquivista-chefe do Heritage Center, diz que existem boatos de que o F-88 seria produzido com o Corvette, mas nunca entrou em produção porque a Divisão Chevrolet não queria concorrência interna. Nem ele nem ninguém confirma a história, mas Datini não liga. Ele é seguro por saber que tem um dos empregos mais legais que se pode imaginar (o conceito LeSabre 1951 de Harley Earl está em um salão a 20 metros de onde estamos sentados). De qualquer modo, o F-88 de produção fracassou, e o conceito para os salões desapareceu na obscuridade.
“Normalmente o que acontecia com estes conceitos dos anos 50 – depois do fim de sua vida útil – era o sucateamento” – diz Datini.
Portanto o F-88 deveria ter sido relegado a uma morte inglória não muito longe do Centro Técnico da GM, mas os documentos da GM sumiram depois de 1959.
Embora existam várias histórias exageradas a respeito do carro – uma delas diz que alguém levou o carro à casa de Earl na Flórida – a versão mais verossímil, melhor documentada, e que foi escrita por Hendricks no display de seu museu, é que Earl encaixotou o carro em partes e despachou as caixas para seu amigo E.L. Cord na Califórnia (como você deve imaginar, E.L. Cord é o cavalheiro que presidiu as extintas Auburn, Cord e Duesenberg no auge de sua glória). As peças encaixotadas foram enviadas com cartas e esquemas detalhados que ainda estão com o carro hoje. Ninguém sabe o que Cord havia planejado para o carro – se ele o usaria como base para uma nova fabricante ou simplesmente queria dirigi-lo por Los Angeles.

Depois da morte de Cord, a pilha de caixas que continham o F-88 desmontado mudou de dono várias vezes. De acordo com o que um executivo aposentado da GM e os filhos e netos dos proprietários anteriores do carro desmontado contaram aos editores do How Stuff Works há quase dez anos, ele não valia muito dinheiro na época. Mas no fim dos anos 70 a pilha de caixas transitou do povo de Hollywood para o circuito de colecionadores.
Quando Lon Krueger – proprietário da Sun Valley Classics, no Arizona – comprou o carro em 1980, ele estava parcialmente montado depois de ter sido trocado por alguma peças Duesenberg. A restauração não foi iniciada antes de 1988, e progredia lentamente. Krueger contou à How Stuff Works que os esquemas e as instruções estavam espalhadas pelas caixas, e que algumas partes haviam deteriorado com o tempo. O F-88 completo foi vendido à Barrett-Jackson em 1991.

O carro exibido no museu é provavelmente bastante fiel ao original exibido na Motorama, mas ainda há algumas dúvidas. Dizem que as peças encaixotadas podem ter sido sobressalentes. Quem sabe?
Fritz Myer, um fanático por carros com sorte bastante para trabalhar cuidando do carro de Hendricks, disse que um velho funcionário da GM que não se identificou apareceu no museu um dia perguntando sobre um caderno preto que haveria sido encaixotado com o F-88. Nem Myer, nem Hendricks tinham a menor ideia sobre o que o cara estava falando.
Isso se tornou outra peça no misterioso e incompleto quebra-cabeças da história deste carro.
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Benjamin Preston é um jornalista e entusiasta que escreveu para a Petersen’s Wheel&Offroad, The Santa Barbara Independent e em seu blog pessoal. Atualmente ele é Editor Associado no Telluride Daily Planet.

Crédito das fotos: Benjamin Preston, GM Heritage Center, GM
Fonte: jalopnik
Disponível no(a): http://www.jalopnik.com.br
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