Todo mundo tem seu carros favoritos. Um destes carros existe só na nossa cabeça, na forma de um carro imaginário que tenha todas as melhores características de todos os anos em que o modelo foi produzido. Para a maioria de nós, isto é só um sonho. Mas não para a Singer. Para eles, estes carros não são mais imaginários.
Para a Singer (especialmente para seu fundador Rob Dickinson, ex-vocalista da banda Catherine Wheel e primo de Bruce Dickinson, do Iron Maiden — é sério), este carro é o Porsche 911. E ainda que a Singer não construa — na verdade eu tive que assinar um documento de várias páginas confirmando que eu compreedndia que a Singer não constrói os carros que chamam de 911 — eles restauram e realizam modificações extensas em seus Porsche 911, e o resultado é conhecido como o Porsche 911 Reimagined by Singer (reimaginado pela Singer) ou algo do tipo. Mas eu vou chamar estes carros de 911, e vocês vão entender o que quero dizer e ninguém vai ser processado. Beleza?
Estes 911 são basicamente o que a maioria dos fãs do 911 gostariam que seus carros fossem se dinheiro não fosse problema. E, para as pessoas que compram estes carros, que partem de US$ 350 mil (cerca de R$ 700 mil), não é. Não existem muitos deles ainda — por volta de 11 já foram finalizados ou estão em processo de construção, e na oficina eles são chamados pelo nome dos países para onde serão enviados. Durante a minha visita, “Dubai” estava em processo de construção e “Indonesia” estava praticamente pronto, enquanto “Sonoma” (os carros que vão para os EUA têm nomes de cidades, pois é o único país que recebeu mais de um carro até agora) estava no início.
Estes 911 começaram a vida como exemplares da penúltima geração do 911 com refrigeração a ar — o 964, produzido de 1989 a 1994. Sendo assim, a mecânica de base é o ápice do desenvolvimento dos motores a ar no 911, enquanto o visual e as sensações vêm do clássico 911 de primeira geração.
Na verdade a situação é ainda mais específica. Um dos carros na oficina mostra o verdadeiro espírito da Singer — o Porsche 911E 1969 do próprio Rob, modificado para parecer um 911R, a versão de corrida da época. Este adorável monstrinho laranja têm muitas das características visuais que a Singer coloca em seus carros: o bocal do tanque de combustível no capô, a tampa do reservatório de óleo no pára-lama traseiro, os protetores de pára-choque na traseira e um jeito visceral e arisco que o 911 tinha e que foi se perdendo à medida que o carro amadurecia e ficava mais refinado.
O 911 repaginado da Singer é um 964 com a maioria das peças da carroceria trocadas por paineis em fibra de carbono, que o fazem parecer muito mais com um Porsche 911 clássico. Iluminação e outros detalhes também são semelhantes, mas não idênticos aos originais. São melhores.
Por exemplo, as lanternas. Rob queria o visual das lanternas clássicas, mas achou que os buracos e parafusos expostos nas peças originais eram meio rústicos demais. Ele gostava do visual, mas queria transformá-las em uma espécie de versão platônica do que elas poderiam ser. Então ele refez totalmente as lanternas — lente, carcaça, tudo — de modo que pudesse usar cola em vez de parafusos, e criou peças bonitas, elegantes e modernas. E elas são perfeitas. Ele fez algumas modificações em busca de modernidade e segurança — a grade da buzina, por exemplo, agora é uma luz de posição. Este tipo de atenção aos detalhes em uma simples lanterna mostra como todo o carro é tratado.
Tudo o que é preservado do carro original é desmontado, limpo e reformado — não que sobre muita coisa. O lado de dentro é todo refeito ao ponto de fazer o interior de Rolls-Royce parecer um bom lugar para comer um cachorro-quente. Referências ao carro original são inúmeras, porém retrabalhadas. O vinil do painel, estampado com um padrão entrelaçado, é substituído por tiras de couro entrelaçado de verdade, na cor que o cliente escolher. Todas as peças de metal são banhadas a níquel, e um sistema de áudio moderno é integrado impecavelmente ao painel com controles que lembrem os de época.
O que eu mais gosto no trabalho da Singer é que eles estão criando um carro moderno com motor preparado (cerca de 350 cv e 38 mkgf de torque), suspensão, freios e carroceria de alto nível, mas mantendo o jeito de máquina de um esportivo clássico. É uma resposta direta ao 911 atual (e, na verdade, à maioria dos esportivos modernos), que a cada ano que passa isola mais o motorista daquela sensação fundamental de controlar uma máquina grande e potente. Sim, os carros modernos são mais seguros, confortáveis e fáceis de guiar, mas o preço disso é uma perda substancial na crueza e na alma destes carros.
Claro, para conseguir de volta a crueza e a alma, o preço é um aumento substancial no… preço. Justiça seja feita: o preço assustador faz sentido quando você vê como estas coisas são construídas. Tudo, cada detalhe destes carros é considerado e feito da melhor maneira possível. Desde a eliminação das buchas de borracha em favor de unidades esféricas de competição, passando pela disposição das mangueiras, até o couro em matelassê do compartimento do motor, nada é feito por acaso.
Eu fotografei uma parede da oficina da Singer, onde os carros que serão transformados ficam guardados. Nela, pixada na letra cursiva de um homem que ficou acordado tempo demais, está a frase everything is important — “tudo é importante”. Rob me contou que escreveu aquilo na parede depois de virar uma noite acordado e, de verdade, não consigo definir melhor o modo como estes carros são feitos. Desde a ventoinha do ar condicionado até o conta-giros laranja, passando pelo material dos bancos até os coletores e cabeçotes — tudo é tratado com respeito e carinho, e tudo se junta para formar um carro estonteante.
Não estou dizendo que os carros são perfeitos. Eu sinto que cada um deles é como um trabalho em eterno andamento, e melhoras e modificações são feitas o tempo todo. Em Willow Springs, vi Tiff Needell testar o “Indonesia” na pista. Quando Rob perguntou se o carro tinha conseguido ir de 0 a 100 km/h em menos de 5 segundos, Tiff disse que não. E acho que ele riu depois. Dava para ver Rob se contorcer, e Marlon fazendo alguns cálculos mentais, porque é lógico que não vai demorar muito para o carro atingir esta marca. Mas precisa de alguns ajustes.
Eles disseram que eu posso testar um deles quando ficar pronto. Mal posso esperar.
Agora, fiquem com algumas fotos da oficina.
O acabamento deste porta-malas é melhor que o da minha casa inteira. Note o funil de borracha do tanque de combustível. Parece um alto-falante.
Estes espelhos são desenhados aqui, banhados em níquel e vão direto no vidro. É o tipo de coisa que só se vê em conceitos. Ouvi dizer que é um saco montá-los e instalá-los.
Este aqui é o quadro de anotações. Eu até entendi os insetos sendo esmagados, mas o resto…
O conta-giros laranja é a assinatura da Singer.
Estes coletores são feitos sob medida para a Singer e, além do visual matador, permitem uma altura maior em relação ao solo.
Tiff Needell, levando o carro da Indonésia para um passeio em Willow Springs
3/4 de frente.
A primeira parte da entrevista com Rob Dickinson:
A segunda parte: E não vamos esquecer de Marlon Goldberg, o mecânico chefe: Participe! Deixe aqui seu comentário. Obrigado!
Disponível no(a):http://www.jalopnik.com.br
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