16 de abr. de 2011

Honda 1300 Coupe 9: o que esse japinha estranho tem de tão especial?




Arriscando um palpite, a média de potência dos carros que aparecem no Jalopnik deve ficar lá pelos 300 cavalos. O Honda 1300 Coupe 9 1969 tem apenas 117 à sua disposição. E eles puxam o carro pelas rodas dianteiras. Mesmo assim, a melhor relação de potência específica de seu tempo – e uma das maravilhas da então nascente engenharia automotiva japonesa – merece um post à parte.

Por quê? Bem, um dos motivos é a sua raridade. Números oficiais são meros palpites hoje em dia, mas pelas nossas contas, a Honda produzir pouco mais de 8.000 Coupe 9. A empresa fabricou uma versão menor, o Coupe 7 de 100 cv, em maior quantidade (cerca de 38.500). Mais importante, apenas 1.053 Honda 1300 Coupe saíram do Japão, a maioria na versão 7. Praticamente todos os Coupe 9 que escaparam foram para a Austrália. Boa parte deles passou a vida nas pistas de corrida. Mas não é a raridade que torna um carro imortal.

Vamos começar com o motor. Cento e poucos cavalos não soam muito até descobrir que eles saem de uma unidade 1.3 a 7.200 rpm. Isso dá 88 cv por litro. Para colocar esse número em perspectiva, o Corvette Z06 faz pouco mais de 72 cv por litro. Em comparação a outros modelos da época, o Camaro Z28 produzia 58 cv por litro. Alguém aí disse alguma coisa? Ah é, a Chevy subestimou a potência do Z28, anunciando apenas 294 cv, enquanto a maioria dos testes no dinamômetro ”provaram” que o modelo estava mais próximo de 395 cv. O que dá apenas 78 por litro.
Mas vamos ficar por aqui na comparação de quatro cilindros aspirados com o que de os americanos tiveram de mais musculoso – vamos analisar o motor em termos de Honda. Quando o muito elogiado e inegavelmente esportivo Honda Integra foi lançado em 1986, seu motor 1.6 16v DOHC VTEC produzia 114 cv. Isso dá cerca 70 cavalos por litro. Nessa hora precisamos lembrar que o Coupe 9 tinha quatro carburadores, câmaras de combustão hemisférica, era refrigerado a ar e tinha cárter seco. Assim como Dr. Piëch e seu Veyron, carros como o 1300 Coupe 9 são o que acontecem quando o manda chuva da empresa é formado em engenharia. E um ego do tamanho de um continente não atrapalha.

A parte da refrigeração a ar é especialmente fascinante. Soichiro Honda estava irredutivamente convencido (na época) que motores refrigerados a ar eram superiores aos equivalentes refrigerados a água. Mas eram barulhentos que só (repara na Kombi da feira, rapaz). Citando o Sr. Honda diretamente:
Já que motores refrigerados a água eventualmente usam ar para arrefecer a água, nós podemos implementar a refrigeração a ar desde o princípio. Isso elimina o problema de vazamentos de água, e facilita a manutenção. A questão aqui é como reduzir a característica barulhenta de um motor refrigerado a ar para um nível comparável ao de um refrigerado a água.
Como os engenheiros da Honda enfrentaram este desafio? Acontece que muito do som associado com um motor refrigerado a ar vem das vibrações harmônicas das pás da ventoinha. Assim, ao invés de aumentá-las e deixá-las mais finas como os alemães, a Honda as deixou mais curtas e largas. Os níveis de ruído caíram significativamente, abaixo da maioria dos motores refrigerados a ar equivalentes da época.

Outra característica genial no processo de resfriamento é o “Duo Dyna Air Cooling”. A maioria dos motores refrigerados a ar depende da passagem de ar por várias partes do motor. Lembre-se da superfície estriada (com aletas) do motor dos VWs. O sistema Duo Dyna por sua vez adotava canais, semelhantes ao dos motores refrigerados a água, só que esses canais recebiam ar fresco (ao invés de um líquido que veio do radiador) por meio de um impulsor (uma espécie de rotor) ligado diretamente ao virabrequim. Em outras palavras, o ar era forçado a passar por entre o motor! Este ar recém-aquecido podia então ser mandado diretamente para o habitáculo – dispensando a espera pelo aquecimento de um óleo nas frias manhãs nipônicas. Nós admiramos tanto o Duo Dyna que é difícil expressar em palavras. O cárter seco ajudava na refrigeração do motor, com aletas de refrigeração ao redor do reservatório.
Bom, então o motor é digno da história, mas e o resto do Coupe 9? Em poucas palavras: é claro que sim. Um dos poucos carros de tração dianteira que se comporta como um verdadeiro carro de tração traseira. Claro, nunca o guiamos, mas vamos tomar a opinião de outros como a nossa própria:
A coisa mais legal de pilotar o Honda 1300 Coupe é que você nunca saberia que ele tem tração dianteira a não ser que espiasse sob o capô antes. Um motorista – um dos mais experientes da indústria automotiva Australiana – pegou o carro para uma voltinha na pista de testes. Ele devorou o traçado com curvas de arrepiar quando comentou casualmente: “Anda bem hein, especialmente para uma maquina com tração dianteira…” Ele estava impressionado. Por sinal, ele não acreditou até que nós abrimos o capô e vimos, sim, o quatro cilindros todo maroto instalado de leste a oeste. E refrigerado a ar para completar.

O senhor Honda usou uma série de truques para oferecer essa dirigibilidade. Primeiro, o motor foi instalado em um subchassi, ao invés da mais comum (e barata) construção monocoque. Este subchassi se estende para trás, abrigando também a transmissão, e posicionado levemente recuado para melhorar a distribuição de peso. A suspensão dianteira era McPherson, enquanto a traseira tinha um curioso sistema de semieixos cruzados. Basicamente, são grandes semieixos instalados ao lado oposto no chassi com todo o tipo de truques para evitar torções e reduzir a mudança de cambagem, e mais importante, evitar as características de pulos próprios dos veículos com semieixo oscilante.
Como comentou na época outro jornalista australiano, “O que então é o resultado dessa soma em termos de comportamento? Colocamos a nossa cabeça a prêmio e o descrevemos como o melhor em todos os carros, independente do tamanho ou configuração”.
O conforto do Coupe 9 estava à altura, com uma curvatura no painel que colocava tudo apontado para o motorista. Tinha ainda sistemas elétricos redundantes nos dois lados do veículo, para que caso levasse uma pancada do lado direito, as luzes de freio continuassem a funcionar.

Certo, você deve estar pensando: e daí? A Honda fez um ótimo ainda que obscuro cupê compacto para os pés-de-chumbo na Austrália e depois começou a espalhar Civics mundo afora. Grande coisa. Mas o 1300 é muito mais do que isso. Ele é o carro que fez da Honda, bem, a Honda. Lembre-se, este foi o primeiro carro de verdade da empresa (ao invés dos charmosos, mas minúsculos microcarros, caso do N360). Em um panorama histórico, foi por causa dele que tivemos décadas depois o NSX e a série Type R.
Segue outra historinha. A lateral da carroceria originalmente deveria ser soldada. O Sr. Honda descobriu então que os gases produzidos na soldagem faziam mal à saúde de seus funcionários. Isso era inaceitável. Ele ordenou uma “eliminação completa da soldagem” e exigiu que encontrassem um caminho. O resultado foi a “estrutura moicana”, que é um pouco mais complexa, mas resultava em uma rigidez estrutural e produtividade maior. A técnica aprendida com a estrutura moicana (peças estampadas) é usada até hoje para produzir a maior parte das carrocerias no mundo. Mais incrível, a fábrica levantada para construir o 1300 não apenas continua em uso, mas a própria máquina continua a produzir Hondas. Incrível.
No entanto, acreditamos que a razão mais forte para incluir este valente Honda em nossa Garagem dos Sonhos não é ligada as características físicas do Coupe 9, mas às atitudes do homem que o construiu e seus concorrentes nipônicos. Quando a Honda exibiu o protótipo do 1300 no Salão de Tóquio de 1968, o presidente da Toyota Motor Industries (Sr. Eiji Toyoda para os meros mortais) ficou em silêncio em frente ao estande da Honda por exatos dez minutos. Ele reuniu então seus engenheiros ao redor do modelo rival e gritou: “O carro da Honda produz 100 cavalos com um motor 1.3. Por que não podemos fazer a mesma coisa?”

Você consegue imaginar Akio Toyoda ou Ferdinand Piëch fazendo algo assim? Você sabe no fundo da alma que A) eles jamais chegariam perto dos estandes rivais e B) se juntassem seus engenheiros eles reclamariam sobre a economia de dois centavos em saídas de ar. Se você já se perguntou porque os Civics e Corollas da vida vendem tanto, a resposta pode estar no Honda 1300 Coupe 9. Além disso, ele se parece com um Alfa Romeo GT 2000.

Fonte: jalopnik
Disponível no(a):http://www.jalopnik.com.br

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