O começo do desenvolvimento do Mustang foi, de certa forma, bem diferente do que você espera. O carro ajudou a definir toda uma categoria de carros, uma combinação altamente apelativa de carro de uso diário, esportivo e muscle car — algo acabou conhecido como “pony car”. Algo que cria uma nova categoria (ou sub-categoria) sempre tem uma história interessante por trás de sua criação, e o Mustang não é exceção.
Talvez a parte mais estranha da história do Mustang tenha algo a ver com a forma com a qual ele começou: o carro era absolutamente diferente do que o Mustang se tornaria, mas ele acabou definindo o nome e dando ao Mustang um de seus elementos de design mais duradouros e marcantes.
Aquele pré-Mustang era o conceito Mustang I, um pequeno roadster esportivo com um V4 em posição central-traseira. O carro foi proposto por Lee Iacocca, que queria um novo esportivo com um design inovador para competir com o Chevrolet Corvair Monza.
O resultado foi um esportivo pequeno e arrebatador, com perfil em cunha e um santantônio ousado atrás do motorista. O motor V4 de 1.500 cm³ e 110 cv era arrefecido por dois radiadores, um em cada lado do carro, que recebiam ar através de um par de respiros nas laterais do carro. O design destes respiros acabou repetido no projeto final do Mustang, embora de forma puramente decorativa, e se tornou um dos elementos mais marcantes do Mustang — ainda que eles não façam sentido na maioria das versões.
O nome Mustang nasceu com o carro. Conta a história que estilista executivo da Ford, John Najjar Ferzely, um entusiasta da aviação, achou que o carro lembrava um avião P-51 Mustang. Há uma outra versão da origem do nome que sugere que o designer Philip Clark sugeriu o nome como referência aos cavalos selvagens que ele havia visto em uma viagem pelo interior do país. Mais à frente veremos que a posição do cavalo na grade também tem origem controversa.
Antes disso, vamos descobrir como um carro que parecia um Porsche 914 acabou se tornando bem mais convencional, com o motor dianteiro e tração traseira que todos nós conhecemos e adoramos. A resposta está no banco de trás.
Mais especificamente na ausência do banco de trás. O Mustang I não tinha como levar mais de duas pessoas porque o motor estava ocupando a traseira do carro. A Ford achou que seu conversível de dois lugares, o Thunderbird, já não estava mais vendendo muito bem, e não queria colocar o novo Mustang na mesma posição. Por isso eles decidiram fazer um carro com lugar para quatro ocupantes. Para a época, o design resultante era mais próximo de um 2+2, já que os bancos traseiros dos carros americanos dos anos 1960 eram imensas planícies de vinil trabalhado, mas o banco era até bem aproveitável.
Outro fator que favoreceu o layout convencional foi o custo. O carro foi várias vezes pensado como “o Thunderbird de pobre”, e para ser efetivamente isso, o carro precisaria ser barato. Para manter o custo baixo, o novo Mustang seria construído com o chassi e componentes do conjunto motriz do compacto Falcon e do Fairlane.
Uma vez que a plataforma foi definida, houve uma competição aberta entre todas as divisões de design da Ford para encontrar o visual certo para o carro, começando em 1961. Houve várias ideias excelentes e radicalmente diferentes, cada uma com seus nomes distintos como “Avventura”, e nomes que eles não poderiam usar por motivos óbvios como Avanti — já usado pela Studebaker.
O conceito Avventura é um dos mais interessantes (embora aqui seja chamado de Allegro). Ele foi bem avançado no uso do layout fastback/hatchback, e tinha uma conexão muito forte com a linguagem de estilo da Ford na época, com suas lanternas traseiras parecendo saídas de motores a jato. Mas o que o torna incrível, mesmo, é a proposta de banco traseiro invertido, no qual os passageiros viajariam de costas para o motorista.
Em setembro de 1962 eles ainda não haviam escolhido o design, por isso foi organizada uma nova competição. Nesse round, Gale Halderman, integrante do estúdio de Joe Oros da Ford, criou este esboço, que é incrivelmente parecido com o que se tornaria o produto final.
O conceito de Halderman foi batizado de Cougar, e este nome chegou perto de ser o nome definitivo do carro. Na verdade, ele acabou batizando o Mustang da Mercury, portanto aqueles que preferem gatos a cavalos, podem se considerar atendidos.
Os modelos e protótipos construídos a partir dos esboços de Halderman são especialmente fascinantes devido à proximidade com o modelo final, o que torna todas as diferenças ainda mais visíveis.
As principais diferenças tinham a ver com o animal na grade. O modelo com o Cougar é fascinante, e é difícil afirmar que ele não fica bem ali. No fim, o espírito americano-caubói-comedor-de-cachorro-quente-amante-de-cavalos prevaleceu, e “Mustang” venceu. Como disse um dos pesquisadores, “Mustang foi o escolhido por conter a empolgação dos espaços abertos e ser americano pra caramba”.
Mas os dilemas não haviam terminado. A grande questão agora era como o cavalo seria colocado na grade.
Houve experimentos com um cavalo parecido com uma peça de xadrez, que ficou muito estranho, mas o vencedor acbou sendo o cavalo de uma escultura de mogno feita por Charles Keresztes. Mesmo depois de escolher o estilo do cavalo, a direção em que ele seria instalado se mostrou uma decisão complicada. Alguns acharam que o cavalo deveria correr para a direita, que é como as pessoas estão acostumadas a ver os cavalos nas corridas, mas como conta o MustangsDaily:
“No fim, Lee Iacocca disse ‘o Mustang é um cavalo selvagem, e não um corredor domesticado’, e assim o designer Gene Halderman achou que o cavalo deveria apontar sempre para a esquerda”
Também havia a ideia de que o cavalo correndo para a esquerda significava que ele estava indo para o Oeste, uma direção que faz parte da história e da cultura americana. O cavalo virado para o outro lado é estranho demais, admito.
O estilo do Mustang estava praticamente definido e continha todos os elementos que ainda esperamos de um Mustang hoje: capô longo e traseira curta, algum entalhe lateral, lanternas segmentadas e um cavalo na grade. Mesmo assim, houve algumas pequenas variações nos primeiros protótipos, como um jogo de faróis ovalados, ao estilo europeu.
Antes do Mustang ser exibido ao público, o carro foi apresentado como um protótipo transformado no conceito Mustang II, em outubro de 1963. Isso me causa estranheza por dois motivos:
Primeiro: eu normalmente penso em carros conceito como antecessores dos carros de produção que eles inspiraram. A ideia de um carro de pré-produção ser transformado em um conceito é exatamente o oposto do que ocorre no processo de desenvolvimento — um conceito torna-se mais mundano e é transformado em um carro de produção em massa.
Além disso, o nome Mustang II foi usado tanto para um conceito radical baseado no Mustang original e também no Ford Pinto disfarçado que foi o Mustang II, lançado após a crise do petróleo em 1973. Ah, a ironia…
O Mustang é um estudo fascinante de design automotivo, e uma grande lição sobre como um projeto relativamente simples pode ser bem sucedido se lançado na hora certa.
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