6 de out. de 2013

F-1: História 40 anos sem Cevert: o galã com sonho de ser campeão



François Cevert durante o GP da Inglaterra de 1971 (Foto: AP)François Cevert durante o GP da Inglaterra de 1971 (Foto: AP)
 
O ano de 1973 foi certamente um dos mais tristes na história da F1. Em março, Clay Regazzoni quase morreu num terrível incêndio durante o GP da África do Sul, em Kyalami. Cinco meses depois, o promissor Roger Williamson, à época bicampeão da F3 Inglesa, pereceu num acidente em sua segunda prova no esporte, em Zandvoort.
No entanto, poucos foram mais dolorosos à comunidade de categoria como o desastre de outubro.
Numa manhã de sábado, exatamente 40 anos atrás, François Cevert, um dos volantes mais promissores no grid, sofria uma violenta colisão na seção dos esses de Watkins Glen, nos Estados Unidos. Lutando com o Tyrrell 006 no caminho da colina, Cevert atacou uma das zebras de forma muito agressiva, o que fez o carro azul deslizar em direção ao muro de proteção. Após o primeiro impacto, o veículo ricocheteou, virando-se para a parede à esquerda a aproximadamente 250 km/h, e se arrastou por cem metros na lâmina do guardrail. O bico do carro fincou no solo, com as rodas para cima e o resto da carenagem no topo do muro. Tudo se tornou poeira e entulho.
Ao fim da cena de horror, dada a dinâmica do acidente, vários pilotos se aproximaram do local. Volante júnior da McLaren, o sul-africano Jody Scheckter foi o primeiro a chegar. Ele saltou de seu M23, correu em direção ao carro de Cevert e se agachou para olhar os escombros. Segundos depois, levantou-se e ergueu os braços num furioso gesto de lamentação. Não havia nada a lutar: o piloto da Tyrrell, com o corpo severamente ferido, fora decapitado. Morrera aos 29 anos de idade.
Acidente de Cevert em Glen (Foto: Divulgação)
Acidente de Cevert em Glen (Foto: Divulgação)
Em sua curta vida, Albert François Cevert Goldenberg foi um dos pilotos mais populares do grid. Olhos tremendamente azuis e pinta de galã, herdara todos os bons atributos de um parisiense: articulado, corajoso, e dotado de enorme senso de humor. Poucas horas antes de morrer, brincara com uma fotolegenda no jornal o descrevendo como “intenso”. “Não somos nós todos?”, sorriu, enquanto degustava uma xícara de chá. Não era difícil prever um futuro para ele como a imagem da F1, numa época em que a categoria ainda formava sua identidade comercial.
Acima de tudo, porém, havia a relação de Cevert com o companheiro de equipe Jackie Stewart. Não apenas os dois foram colegas de equipe durante quatro temporadas, como o francês era visto como uma espécie de sucessor do britânico, que considerava a aposentadoria desde o fim de 1971. Isso muito se deu pelo ótimo relacionamento entre Stewart e Ken Tyrrell, que eram muito mais que chefe e patrão e identificavam no jovem nativo de Paris um futuro campeão mundial.
O curioso é que, em seus primeiros anos na F1, as apostas em Cevert eram ínfimas. Ex-pianista clássico e descendente de judeus, ele chegou à categoria máxima com amparo da petroleira Elf, que patrocinava a Tyrrell e bancava a carreira de jovens pilotos franceses, entre eles Johnny Servoz-Gavin e (o nem tão jovem assim) Jean-Pierre Beltoise. Antes disso, conquistara a F3 Francesa em 1967 e passara os dois anos seguintes na F2 com mediano sucesso – o ponto alto foi uma “quase-vitória” em Tulln-Langenlebarn, em 1969, em que duelou com Jochen Rindt. Em suma, muito pouco para quem desejava chegar à F1.
Cevert com o March 701 em 1970, sua primeira temporada na F1 (Foto: Divulgação)
Cevert com o March 701 em 1970, sua primeira temporada na F1 (Foto: Divulgação)
De qualquer forma, sua hora chegou no GP da Holanda, em junho de 1970. Servoz-Gavin repentinamente deixou a equipe após sofrer uma colisão em Monte Carlo e abriu espaço para um novo protegido da Elf. Correr ao lado de um campeão mundial sem participar de nenhum teste certamente seria um desafio um tanto indigesto, mas Cevert topou e alinhou o March 701 na 15ª posição do grid em Zandvoort, 13 atrás de Stewart. Tímido, preferiu adotar uma pilotagem conservadora e acatar a recomendação de Tyrrell: não bater.
Os GPs seguintes foram difíceis. Houve apresentações sem fôlego no fim de 1970 e a temporada seguinte foi ainda mais fraca. O francês só obteve seu primeiro pódio em julho, no GP doméstico, e embora tenha vencido a etapa de Watkins Glen, quatro meses depois, encarou a dura realidade de virar, em média, 1s8 mais devagar que Stewart em treinos classificatórios. Hoje em dia, qualquer chefe de equipe, sem pestanejar, descartaria um piloto tão facilmente dominado pelo companheiro.
Por que Tyrrell e Stewart resolveram manter Cevert por mais dois anos é uma incógnita até hoje. Mas a aposta relativamente deu certo e, pouco a pouco, com assistência de Stewart, evoluiu. Tanto que seu último ano foi bastante sólido. Por vezes, equiparou o ritmo ou mesmo superou o escocês. Claro, houve provas desastrosas como o GP da Áustria, quando bateu sozinho no muro de proteção, mas também virtuosas como o GP da Bélgica, em que se recuperou de um erro bisonho na liderança e escalou o pelotão, vindo do oitavo lugar para cruzar em segundo. Ainda naquela temporada, obteve mais seis pódios com o Tyrrell e parecia pronto para uma definitiva ascensão ao grupo dos pilotos de ponta em 1974 até a tragédia em Watkins Glen.
Cevert durante o GP da Alemanha de 1971 (Foto: Divulgação)
Cevert durante o GP da Alemanha de 1971 (Foto: Divulgação)
Naquele dia, Cevert parecia determinado a confirmar a pole position. Suspeitando que Stewart preparava sua aposentadoria, ele sonhava em ser o primeiro campeão mundial da França. Desde a morte de Jean-Pierre Wimille, no fim dos anos 40, o país não tinha um piloto lutando por vitórias na F1: Jean Behra e Maurice Trintignant passaram perto nos anos 50, mas a década seguinte foi dominada inteiramente por anglófonos, em especial os britânicos, representados por uma geração de titãs que incluía Jim Clark, John Surtees, Graham Hill e o próprio Stewart.
Antes de sair para a última volta rápida, Cevert conversou rapidamente com o engenheiro de pista Jo Ramirez. Deixou a garagem, e um minuto e meio depois, lá estava o espirituoso francês passando por ali e acenando de forma amistosa à equipe. Mais um giro e ele voltou a passar em frente à mesa de controle de tempo da Tyrrell. Veio mais uma volta e Ken Tyrrell, olhando atentamente ao cronômetro, deixou escapar na mente uns segundos de contagem a mais. Mas Cevert não retornou.
A terceira marcha permitia um giro mais rápido nos esses de Glen, mas a quarta, como Stewart havia aconselhado, amaciava mais o estreito entre-eixos do carro, tornando-o inerte, embora mais lento, às inúmeras ondulações no trecho. Cevert arriscou a terceira. E, com isso, a própria vida. No circuito em que conquistou sua única vitória na F1.
Após sua morte, Stewart e Chris Amon, piloto convidado da Tyrrell, imediatamente desistiram do GP dos Estados Unidos. O escocês, que disputaria sua 100ª e última prova na F1, nunca mais retornou às pistas. Aquela semana fora a mais agonizante em sua vida – um breve contraste pouco mais de um mês após confirmar seu terceiro título na categoria.
Já a França testemunharia seu primeiro campeão mundial em 1985, o previdente Alain Prost, e revelaria novos talentos como Didier Pironi e Jacques Laffite. Nenhum, porém, com o carisma e a vivacidade de Cevert.
Cevert com o amigo e "professor" Stewart (Foto: Divulgação)
Cevert com o amigo e “professor” Stewart (Foto: Divulgação)
OS NÚMEROS DE CEVERT
Nome completo: Albert François Cevert Goldenberg
Data de nascimento: 25/2/1944, em Paris (França)
Data de morte: 6/10/1973, em Watkins Glen (EUA)
Corridas: 47 (46 largadas)
Vitórias: 1 (GP dos EUA-71)
Poles: nenhuma
Melhores voltas: 2
Pódios: 13
Pontos na F1: 89
Equipes: Tyrrell (1970-73)

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