O Peugeot 208 europeu ainda estava fresco na memória, do nosso encontro no Salão de Genebra três semana atrás, quando cheguei para avaliar o 208 nacional desta reportagem, fabricado em Porto Real (RJ) e que chega às lojas a partir do dia 13 de abril. Quer saber?
Dá gosto de ver que o carro daqui é praticamente igual ao vendido na Europa. O modelo chega para redimir a Peugeot brasileira após o polêmico 207 (na verdade um 206 repaginado) e mostrar que os dias de carros “up-to-date” com os principais mercados vieram para ficar. Prova disso é a que a marca já anunciou a produção do 2008, crossover derivado do 208 e lançado na mostra Suíça, para o final de 2014 no Brasil. Mas agora vamos focar no 208 Allure 1.5 que dirigimos durante o lançamento realizado em Búzios, no litoral fluminense.
O que é?
Voltamos a ter um Peugeot compacto moderno. A começar pela chave canivete inédita, e não mais aquela do 307 que foi para o 308, 3008 e um monte de modelo da marca. Ver o 208 nas ruas envelhece os demais carros, lembrando do tempo em que o 206 se destacava da multidão, no final dos anos 90. O novo felino não chega a ter formas revolucionárias, mas encanta pelos detalhes bem trabalhados. Os faróis têm desenho refinado, com uma “puxadinha” na parte superior para abrigar os LEDs de iluminação diurna (item de série em todas as versões). As lanternas também são estilosas, tipo bumerangue, que formam a letra “C” na lateral – a Peugeot diz que é a garra de um leão. Outros pormenores interessantes incluem a moldura dos faróis de neblina, o recorte da linha das janelas na altura dos retrovisores e o contorno no capô que emoldura o logotipo do marca. O 208 certamente assume a ponta da categoria quando o assunto é visual.
Como adiantei no começo, há poucas diferenças entre o 208 europeu, lançado há menos de um ano, e o brasileiro. Uma das coisas que mudou foi o desenho do para-choque dianteiro, que teve de ser adaptado à placa brasileira. “Nossa placa é menor que a europeia, só que bem mais alta, e isso atrapalhava a tomada de ar para o radiador, algo bem crítico num país tropical como o Brasil”, explica o gerente de produto Sergio Davico. Dessa forma, a grade ficou um pouco menor e os faróis de neblina foram deslocados mais para as extremidades do para-choque, abrindo espaço para uma tomada de ar maior. Também foi preciso mexer na suspensão, elevada em 10 mm para livrar o carro de “beijar” lombadas e não raspar embaixo. Já as molas ficaram mais macias e os amortecedores ganharam curso, além de um stop hidráulico para não dar pancadas secas nos buracos – lembra dos primeiros 206? Por fim, o tanque foi ampliado em cinco litros (55 l no total), de olho na autonomia, especialmente com o uso de etanol.
Davico conta que a participação da engenharia brasileira desde o início do projeto, há cerca de quatro anos, facilitou o processo de adaptação ao mercado brasileiro. “Já pedimos, por exemplo, que o escapamento fosse colocado numa posição que permitisse a instalação de um tanque maior aqui sem precisar refazer a estrutura”, revela o engenheiro. Segundo a Peugeot, o carro brasileiro segue o mesmo padrão de construção do europeu, inclusive no que diz respeito à absorção de impactos – o 208 de lá obteve cinco estrelas na classificação do Euro NCAP. O que muda é a oferta de equipamentos de segurança, como o ESP e a fixação Isofix para cadeirinhas, que não são oferecidos do lado de cá do Atlântico. Vale dizer que a fábrica fluminense é a única fora da Europa a produzir o 208, para abastecer os mercados do Mercosul. A plataforma é a mesma do novo Citroën C3, com quem divide a linha de montagem.
O melhor do 208, no entanto, é assumir o comando. Diferente de algumas rivais, a Peugeot projetou um interior tão bacana e inovador quanto a carroceria. Tanto que a campanha do modelo será baseada no tema “let your body drive“, ou “deixe seu corpo dirigir”, uma vez que o modelo propõe uma forma diferente de guiar. O hatch recebeu um quadro de instrumentos elevado, como se fosse um head-up display, e adotou um volante bem esportivo, de diâmetro reduzido (350 mm) e desenho achatado nas partes inferior e superior. A proposta é que você veja os mostradores por cima da direção, e não mais por dentro do aro dela. Para um acerto fino, o volante regula em altura e profundidade, e o banco oferece ajuste de altura por alavanca em todas as versões.
Além dos instrumentos estarem bem no campo de visão do motorista, o velocímetro ganha ênfase porque também aparece num visor digital no centro do painel, lembrando a leitura que temos no Honda Civic. E os mostradores do “nosso” 208 são até mais modernos que os do europeu, pois aqui os marcadores de temperatura do motor e nível de combustível são digitais, em substituição aos ponteiros de lá – embora o visual e o tamanho das escalas sejam iguais. Isso reflete o cuidado que a Peugeot teve com os detalhes, algo que também pode ser visto no acabamento geral do carro. Nessa versão Allure, intermediária, o interior apresenta uma agradável combinação de cores e texturas, com o painel preto combinando com uma faixa cinza clara que atravessa a peça, em contraste com as colunas brancas. Ainda que o material utilizado na cabine não fuja do básico plástico rígido, as peças têm encaixe perfeito e não há sinal de rebarbas. Tecido dos bancos e revestimento do teto também seguem o bom padrão de aparência e qualidade.
A experiência a bordo do 208 se completa com a central de entretenimento comandada por uma tela de sete polegadas sensível ao toque. O sistema agrega GPS (com mapa Navteq), rádio, Bluetooth e entradas USB e auxiliar para execução de músicas e visualização de fotos, além de permitir controlar o funcionamento de algumas funções do carro, como a trava automática das portas. CD player? Coisa do passado, assim como no My Link do Chevrolet Onix. Afora a facilidade de acesso, por estar em posição elevada, o sistema é prático e funciona bem, mas convém gastar alguns minutos antes de sair com o carro para aprender a navegar corretamente entre as funções. Os comandos satélites, antes numa alavanca à esquerda da direção, agora estão no próprio volante.
Como anda?
Minha maior curiosidade sobre o 208 residia na tal posição ao volante. Houve quem estranhasse, mas não coloque meu nome nessa lista. Além de me adaptar rapidamente, gostei de poder dirigir “lá em baixo” – em oposição à maioria dos novos compactos, que têm o assento elevado. O pequeno volante tem bom encaixe para mãos e convida a uma condução mais animada, enquanto o quadro de instrumentos elevado permite que você praticamente não desvie os olhos da estrada para enxergá-lo.
Em movimento, a primeira coisa que chama a atenção é a leveza da direção – com assistência elétrica, pela primeira vez num Peugeot compacto. Diferente da maioria dos carros da marca, de volante pesado, o 208 é suave de manobrar e só enrijece à medida que a velocidade aumenta. A suspensão também ficou bem calibrada. Mais macia que a do 207, fez o carro passar com conforto (e silêncio) pelas ondulações e buracos do trajeto, mostrando que a Peugeot enfim parece ter feito as pazes com o piso brasileiro. A elevação na altura do solo permitiu boa superação de obstáculos, realmente sem raspar a frente nas valetas e lombadas.
As curvas da Via Lagos, que liga o Rio a Búzios, serviram de testemunha para a boa estabilidade do 208. Mesmo confortável, o hatch exibe movimentos bem controlados e não inclina muito nas tomadas de tangente e desvios rápidos (essa versão traz aros 15 com pneus 195/60), além de a direção ter boa sensibilidade e peso correto em velocidades elevadas. Mas a embreagem e o câmbio destoam um pouco da tocada, digamos, “esportiva” do 208, por exibirem curso longo. A transmissão é a mesma do C3, com a diferença de que o pomo da alavanca do Peugeot tem melhor ergonomia.
Pela primeira vez equipando um Peugeot, o motor 1.5 8V – na verdade 1.45, evolução do 1.4 do 207 – se mostrou “redondinho” para o novo hatch – nem falta, nem sobra. Ainda que a potência seja limitada, de 93 cv com etanol (o Onix 1.4 tem 106 cv), o torque de 14,2 kgfm a 3.000 rpm se encarrega de deixar as respostas espertas desde giros baixos – segundo a marca, 80% da força é entregue a 2.000 rpm. Ou seja, dá para dirigir com agilidade na cidade sem precisar fincar o pé no acelerador. E mesmo na estrada o desempenho convence, só sendo necessário fazer reduções para as ultrapassagens. A marca informa 0 a 100 km/h em 10,9 s e máxima de 181 km/h, além de consumo nota A pelo Inmetro. Dirigindo sem se preocupar com economia entre o Rio e Búzios, registramos média de 9,6 km/l de etanol no computador de bordo. Mas ouvi que teve gente que conseguiu cerca de 11 km/l andando mais devagar.
Outra boa surpresa ficou pelo baixo nível de ruído interno, ajudado pela dupla guarnição de borracha nas portas (feita para manter a poeira do lado de fora) e pela relação acertada de transmissão. A 120 km/h em quinta marcha, o motor trabalha a menos de 3.500 rpm – praticamente a mesma rotação da versão 1.6 16V, que será alvo de um teste completo aqui em breve.
Na parte do test-drive em que fui de passageiro, gostei do espaço oferecido ao carona, ampliado pelo painel recuado na área do porta-luvas. Atrás, também não tive problemas com as pernas. O 208 se vale do maior entre-eixos da categoria (2,54 m) para entregar boa distância para o banco da frente. Mas o mesmo não pode ser dito da altura na parte traseira. Com meu 1,78 m, fiquei com a cabeça raspando no teto. Já o porta-malas tem o tamanho padrão do segmento: 285 litros. A novidade fica por conta da localização do estepe, agora sob o forro – e não mais embaixo do carro como no 207.
Em relação ao 207, aliás, o 208 deu uma crescidinha. Anote aí: são 9,4 cm a mais de comprimento, 2,6 cm de altura e 9,8 cm de entre-eixos. Mas tudo sem pesar demais na balança. Essa versão 1.5 acusa 1.086 kg, uma marca que ainda deixa o carro com uma agradável sensação de leveza ao dirigir.
Quanto custa?
Sucesso na Europa, onde já é líder na categoria dos compactos, o 208 chega ao Brasil para recuperar o tempo perdido pela não vinda do 207 original. E a maior aposta da marca está justamente nessa versão Allure, que deve responder por 50% do mix do modelo. Tabelada a R$ 45.990, ela vem com praticamente tudo que interessa: central multimídia, teto panorâmico, rodas de liga, retrovisores elétricos e faróis de neblina, além dos itens que são de série desde a versão Active de entrada (R$ 39.990), como ar-condicionado, duplo airbag, ABS e direção elétrica. Só senti falta dos vidros elétricos atrás, que numa economia sem razão só são oferecidos na versão Griffe 1.6, de R$ 50.690 com câmbio manual e R$ 54.690 com transmissão automática – a mesma velha caixa de quatro marchas, agora com borboletas.
Particularmente, acho que cabe uma versão entre a Active e a Allure, pois a diferença de R% 6 mil entre elas é grande para essa categoria de carro, mesmo diluída num financiamento. E, vá por mim, não é o 208 básico que você vai querer. Veja nas fotos de divulgação da galeria (no final da matéria) como o painel perde parte de graça sem o sistema de entretenimento e o volante sem os comandos do som – sem falar nas rodas de aço com calotas. Uma opção seria oferecer o teto panorâmico como opcional, baixando o Allure para uns R$ 43 mil, uma vez que nem todos gostam do equipamento por deixar a cabine mais quente em dia de sol.
Mesmo com o 208 assumindo o papel de carro-chefe da marca (a expectativa é vender de 2.500 a 3.000 unidades/mês), o 207 será mantido nas versões de entrada (incluindo o sedã Passion), sempre com motor 1.4 – 1.6 agora só para a picape Hoggar. Em termos de pós-venda, a Peugeot oferece para o novo compacto a garantia de três anos, as revisões com preço fixo e um seguro no valor de 5% do carro, sem perfil de motorista ou localidade.
Belo, divertido de dirigir e atualizado com o “Primeiro Mundo” na maioria dos quesitos, o 208 é aquele tipo de carro que torço para dar certo, para que as marcas rivais se motivem a seguir o exemplo. Agora é com o consumidor brasileiro.
Por Daniel Messeder, de Armação dos Búzios (RJ)
Viagem a convite da Peugeot
Ficha técnica – Peugeot 208 1.5
Motor: dianteiro, transversal, quatro cilindros, 1.449 cm3, 8 válvulas, comando simples; flex; Potência: 89/93 cv a 5.500 rpm; Torque: 13,5/14,2 kgfm a 3.000 rpm; Transmissão: câmbio manual de cinco marchas, tração dianteira; Direção: elétrica; Suspensão: Independente Mac Pherson na dianteira e eixo de torção na traseira; Freios: disco na dianteira e tambor na traseira, com ABS; Peso: 1.086 kg; Porta-malas: 285 litros; Dimensões: comprimento 3,966 mm, largura 1,702 mm, altura 1,472 mm, entreeixos 2,540 mm; Aceleração 0 a 100 km/h: 10,9 s; Velocidade máxima: 181 km/h
Disponível no(a):http://carplace.virgula.uol.com.br
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