23 de mar. de 2012
My Fair Lady: uma breve história do Datsun Z
Depois de muitos rumores, o CEO da Nissan Carlos Ghosn anunciou nessa semana que sim, a marca Datsun está de volta. Motivo para comemorar? Não dá para dizer agora, visto que a ressurreição da marca visa atender mercados emergentes como Indonésia, Índia e Rússia com “carros simples, de pouca cilindrada, econômicos, ecológicos e com alto conteúdo local.” Ainda que essas palavras não empolguem, é impossível não ficar saudosista diante de uma notícia dessas.
Os Datsun sempre foram sinônimo de confiabilidade a um baixo preço, especialmente com a linha 510/Bluebird. A Datsun fazia sucesso no Japão desde 1932, quando ainda era o nome que o grupo Nissan usava em seus carros. Só a partir dos anos 1970 foi que o nome Datsun começou a perder espaço – nessa época passaram a ser usados os emblemas “Datsun by Nissan”, prática que durou mais de uma década. O último carro a usar o nome Datsun foi o 300ZX de primeira geração, o último dos Z-cars no século 20.
Z-cars. A expressão pode trazer duas coisas a sua memória: a aclamada linha de roadsters da BMW ou os populares esportivos japoneses que viraram lenda pelo mundo a partir da década de 70. Ainda que grande parte dos nossos leitores provavelmente fique com a primeira opção, acreditamos que a história dos japoneses é mais romântica e bonita.
O primeiro dos carros Z tem raízes no Toyota 2000GT. Há pouco citamos aqui o desenvolvimento do carro da Toyota, que foi resultado de um trabalho em conjunto entre Nissan e Yamaha. Na verdade, a Nissan descartou um projeto da Yamaha, que o vendeu praticamente pronto para a Toyota. Só depois do sucesso do 2000GT a Nissan percebeu a importância que um esportivo poderia ter para a marca. Algo com preço atraente, visual estiloso (que, não por acaso, também lembrava o Jaguar E-Type), e algumas inovações (como a suspensão independente nas quatro rodas) sem perder a simplicidade, que a primeira geração do Z-car, batizada de S30, foi lançada em 1968.
Seu nome foi motivo de controvérsia dentro da empresa. Enquanto no Japão foi adotado o nome Nissan Fairlady Z, herança do roadster Fairlady 2000, alguns acreditavam que o nome não pudesse ser bem recebido pelo público americano. Como o carro usava um motor seis-cilindros de 2,4 litros, nos EUA foi chamado de Datsun 240Z. Foi um sucesso. Trazia uma boa variedade de versões e motores – incluindo uma que tinha o mesmo motor do Skyline 2000 GT-R “Hakosuka”. Aliás, outra medida que contribuiu para o sucesso do 240Z foi o compartilhamento de peças com outros carros da marca.
O sucesso no mercado americano foi uma aposta que deu certo: a Nissan acreditava que nem todo mundo nos EUA podia (ou queria) pagar por um carro com motorzão de V8 7,0 litros e 350 cv, e se apoiavam na agilidade e dirigibilidade do fastback de dois lugares com um seis-em-linha de 150 cv para conquistar consumidores.
Funcionou, e com o passar dos anos o carro recebeu versões com motores de 2,6 e 2,8L e até uma com configuração 2+2. Com o kit apropriadamente chamado de Samurai, o 0 a 100 km/h podia ser cumprido em seis segundos. Durou até 1978, e hoje é um dos favoritos dos entusiastas da preparação de antigos, pois se adapta facilmente a qualquer modificação – e até trocas de motor.
No ano seguinte era lançada a segunda geração (S130). O chamado 280ZX seguia as linhas gerais do antecessor, porém era menos curvilíneo, um pouco maior e mais pesado. Não era um carro ruim, pelo contrário, mas como resultado da crise do petróleo, ficou menos potente: apenas 110 cv. Nunca atingiu o mesmo sucesso do S30 e deixou o mercado em 1983.
As coisas mudariam no ano seguinte, com a chegada do 300ZX de primeira geração (Z31). Os novos tempos pediam linhas retas, materiais plásticos e faróis escamoteáveis. O novo Z trazia tudo isso e ainda um V6 de 200 cv com turbocompressor. A concorrência americana, no entanto, estava retomando o mercado com novidades, e o 300ZX precisava deixar a simplicidade de lado para não ficar para trás. Modernidades como freios ABS e injeção eletrônica multiponto tornaram o carro mais desejável.
Ele foi, de fato, o último dos Datsun – nome que já vinha sendo deixado de lado nos EUA. No Japão, como seus antecessores, o carro se chamava Nissan Fairlady Z. Sua vida não foi muito longa, porém anos depois o Z32 abriria caminho dentro de um novo nicho que no início da década de 90 chegou com força total: o dos esportivos japoneses como o Toyota Supra, o Mitsubishi 3000GT e, em última instância, o Honda NSX.
Mas a gente aqui acha que não é justo deixar de fora da lista o último dos Z-cars do século passado, e o primeiro Z não-Datsun. Há grandes chances de você ter jogado com ele no primeiro Gran Turismo. E no segundo. E no terceiro… O 300ZX/Fairlady Z Z32 também foi pioneiro em outras coisas. Foi com ele que o Z passou a ser um superesportivo. As linhas retas se tornaram fluidas, a carroceria ganhou superfícies lisas recortadas por vincos laterais suaves, e uma elegante frente com faróis fixos no lugar dos antigos escamoteáveis. A traseira era inspirada no primeiro Z.
Se o ZX anterior era um bom carro em um mau momento, o novo não poderia ter chegado em melhor hora. Com muita tecnologia embarcada, um excelente motor V6 de 3,0 litros de até 300 cv (280 no Japão, devido a um acordo de cavalheiros que limitava a potência máxima dos carros), o 300ZX de quarta geração fazia frente ao que havia de melhor na época. Como era tradição desde seus primórdios, o interior confortável e de ergonomia exemplar poderia ser de dois lugares ou 2+2.
Como já dissemos, a versão mais potente era movida por um V6 biturbo 24v de 300 cv. E foi exatamente essa versão que foi colocada para brigar com outro expoente japonês da época, o Mitsubishi 3000GT VR-4, sob o comando de Christian Fittipaldi, na Quatro Rodas de Maio de 1992.
Christian exaltou as qualidades de direção esportiva do 300ZX, que ainda levou a melhor sobre o Mitsubishi quando o assunto era acelerar. O tempo de 0-100 do Nissan ficou em 6,14 segundos e, no final da reta de Jacarepaguá, alcançou os 225 km/h. No entanto, o 3000GT superou o Fairlady Z nas provas de estabilidade. Mas houve um bom motivo para isso: o carro testado por Fittipaldi era de tração traseira, enquanto o Mitsubishi tinha tração integral – disponível em outras versões do 300ZX. Só que o Nissan venceu o comparativo, pois agradou mais ao piloto nos quesitos câmbio, frenagem, espaço interno e estilo – “limpo, liso e com ótima aerodinâmica”, palavras de Christian.
O fim do 300ZX, mais uma vez, foi consequência dos tempos. Se no início o mercado era quente para ele e seus iguais, passados poucos anos os consumidores já não estavam dispostos a pagar caro em um carro de desempenho que não ficava muito à vontade nas ruas movimentadas das cidades, e em 1996 o esportivo deixava o mercado americano. Um ano depois, era decretado seu fim também no Japão. O último Z do século deixou saudades e definitivamente marcou época.
Em 1999, porém, um conceito inspirado naquele primeiro Z-car foi apresentado no Salão de Detroit. A proposta de um esportivo simples e relativamente barato voltou a fazer a cabeça da Nissan, e em 2001 aquele conceito daria origem ao bem sucedido 350Z (Z33), e o Fairlady estava de volta ao Japão. Durou até 2007, quando foi atualizado e se tornou o 370Z, que está em linha ainda hoje. Os dois carros carregam nomes que fazem referência a suas respectivas cilindradas, com motores 3,5 e 3,7L, sempre com seis cilindros em V.
Mas o que esperar da nova Datsun? Aparentemente a proposta é torná-la para a Nissan o que a Dacia é hoje para a Renault: uma marca popular, direcionada aos mercados emergentes, com carros que podem servir de base para modelos Nissan em outros países, e também um laboratório de desenvolvimento. Nada muito diferente do que era no começo, se pensarmos bem. Em uma época onde tantas marcas lendárias estão morrendo, um retorno como esse pelo menos ajuda a preservar um pouco o legado automotivo.
E nada impede esses caras de criarem versões esportivas de carros populares. A Nismo está aí para isso.
Fonte: jalopnik
Disponível no(a): http://www.jalopnik.com.br/
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