O cara por trás destes novos traços é João Paulo Cunha Melo. O conheci quando ainda trabalhava no departamento de design da Fiat (foram quatro anos lá, entre 2008 e 2013 – hoje ele é designer da Marcopolo), em Betim. Na época, o conceito de 2006 (imagem abaixo), feito por João Paulo em parceria com Felipe Guimarães Coelho, já acumulava quatro ou cinco anos nas costas, gozava de projeção mundial e algumas tentativas significativas de torná-lo real – que acabaram não se concretizando, graças à crise econômica de 2008 e alguns desentendimentos entre os investidores.
Há alguns dias, João Paulo me mostrou uma série de renders de sua nova versão do Interlagos Concept – o “20??” (as interrogações brincam com a incerteza de sua data e possibilidade de produção), repaginado com todas as experiências acumuladas nestes últimos sete anos. “No conceito de 2006, ainda era estudante na Belas Artes (Design Industrial). Esta nova versão não é só mais musculosa, fluida e proporcional – ela também é muito mais viável no ponto de vista técnico” explica, se referindo às lanternas minúsculas e à lateral plana do antigo conceito, que formava um ângulo agudo com a linha de cintura.
Se o antigo conceito tinha algo de uma modernização adaptada do antigo Interlagos, a versão 2013 é um automóvel retrô propriamente dito, com inspiração conceitual e remissões estilísticas, mas identidade própria – mais ou menos como o que acontece com o Porsche 911 ou o Jaguar F-Type. Os traços essenciais do Interlagos, como os para-lamas abaulados, o vidro traseiro curvo e que invade a coluna C de forma triangular, a tampa dianteira vincada, os respiros e sobressaltos compactos e a saída de ar entre as lanternas, estão todos lá, mas integram uma carroceria esportiva contemporânea.
A fonte de inspiração para as proporções básicas do novo Interlagos Concept veio de outro esportivo de motor central-traseiro sensacional: o Alfa Romeo 4C. “Quando o vi pela primeira vez, sabia que suas proporções cairiam como uma luva no que queria para o Interlagos. Então o tamanho, overhang (balanço dianteiro e traseiro), entre-eixos, tudo é baseado neste Alfinha”.
Em números, o que isso quer dizer? Anote aí: 1,18 m de altura (para se ter uma ideia, o Porsche Cayman tem 1,29 m), 3,99 m de comprimento, entre-eixos de apenas 2,38 m e 1,86 m de largura. Com estas proporções, espere por um carro de transições dinâmicas bem rápidas – e, considerando o seu motor central-traseiro, uma traseira, no mínimo, divertida. O novo modelo ficou 27 mm mais alto, mas é 20 mm mais curto e 78 mm mais largo que o conceito anterior – esta nova proporção o deixou visualmente mais robusto, de acordo com João Paulo.
O Interlagos Concept 20?? foi pensado para receber um motor central-traseiro de quatro cilindros em linha – “seria legal se fosse um 2.0 turbinado da Renault ou da Ford, pois assim estaríamos totalmente dentro do contexto histórico. Por outro lado, nada impediria de usarmos um motor Toyota ou Honda, por exemplo, como a Lotus faz com seus carros”, diz Melo. No atual estágio, o conceito é apenas uma carroceria, sem projeto de cabine ou de suspensão: “ele foi idealizado como um carro de estrutura tubular com carroceria de fibra de vidro, como o Lobini”, completa.
Mas e aí? E para o conceito sair da prancheta virtual para as ruas? “Sem dúvidas, há muitas dificuldades. Fora os desafios inerentes a todo projeto automobilístico de escala reduzida, como os impostos, a engenharia, os fornecedores, a logística de fabricação e distribuição, etapas de acabamento, desenvolvimento e tudo mais, a parte mais difícil é achar um grupo de empresários com a mentalidade adequada”, afirma João Paulo.
Ele completa: “com isso, quero dizer um perfil definitivamente empreendedor, que encare isso como um negócio, e não como um brinquedinho, com vaidades e disputas de ego entre os investidores” – Melo preferiu não entrar muito na história, mas claramente se refere a alguma experiência passada com o primeiro conceito, que chegou perto de ser produzido.
Por outro lado, ele se mantém otimista frente à capacidade técnica dos brasileiros: “nós estamos plenamente qualificados. Temos capacidade de execução, fornecedores, possuímos o maior fabricante de ônibus do mundo (a Marcopolo), temos a Embreaer e várias das fábricas de automóveis daqui fazem seus próprios projetos, que são inclusive exportados – bem como componentes mecânicos. Nossa capacidade está fora de questão”, afirma.
E quanto à lei aprovada em março de 2009, que exige que todos os carros produzidos a partir de 2014 sejam equipados com air bags e freios ABS? “Sem dúvida isso encarece bastante o projeto, mas não inviabiliza – ainda mais hoje, com todos os softwares de simulação usados pela indústria. Eles não dispensam a parte empírica, claro, mas eliminam e barateiam muitas etapas. A implementação do ABS não é tão cara, a dos air bags já é um pouco mais complicada, mas o segredo tanto destes equipamentos quanto a parte mecânica, elétrica e eletrônica do Interlagos Concept está na definição dos fornecedores. Digamos que conseguíssemos um acordo com a Renault para que eles fornecessem estes componentes: daí todo o desenvolvimento do projeto orbitaria em torno disso”.
João Paulo estima que, para ser competitivo, seu preço esteja em torno dos R$ 100 mil. “Se for muito acima disso, vamos brigar com carros de alto luxo e até alguns superesportivos usados. Não dá. É por isso que sua receita não tem mecânica exótica nem vamos pensar em soluções mirabolantes”. Ele pensa em duas outras soluções possíveis para o projeto: “uma seria partirmos de uma plataforma comum que servisse a vários carros. Uma boa base para isso seria o Lobini. Outra ideia seria fazer do Interlagos um esportivo elétrico – o investimento seria maior, mas pense na possibilidade de retorno, principalmente no contexto de exportação”, provoca.
A sua aposta no Interlagos como produto é a mesma fonte de sua inspiração: “ele não é só um esportivo. É um carro que possui toda uma história por trás, feita com grandes pilotos brasileiros, como Bird Clemente e Emerson Fittipaldi, que estamos buscando resgatar e implementar em uma releitura que não desperdice essa essência.”
Melo não considera seu projeto finalizado, mas julga importante interromper temporariamente no atual estágio. “A essência do projeto está aí. Claro que, se olhar para ele daqui algumas semanas ou meses, vou querer mexer aqui e ali, como acontece com todo designer. A obra nunca está acabada. Mas é importante saber interromper o desenvolvimento. Até porque, entre hoje e uma possível implementação, haveria conversas com fornecedores e com a engenharia que poderiam mudar vários detalhes.”
Nós torcemos para que esta implementação aconteça muito em breve. Para conhecer mais os trabalhos de João Paulo, acesse o seu site!
Participe! Deixe aqui seu comentário. Obrigado! Disponível no(a):http://www.jalopnik.com.br/
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