Para os leitores de manchete, é apenas um caso de outra fábrica de motores à procura de tinta preta barata para ligar sua marca ao maior público esportivo e contínuo do planeta, portanto não vale a pena dedicar atenção a um ou dois parágrafos. Para aqueles no loop da F1, no entanto, o fato de Wolfgang Durheimer – falaremos dele depois – ter reconhecido que, em breve, recomendará aos seus chefes na Volkswagen que a companhia entre na F1 mais cedo ou mais tarde está entre um dos anúncios mais significativos dos últimos 12 meses.
Para tais leitores, a Volkswagen é uma marca, uma fornecedora de qualidade com engenharia teutônica, mas que faz carros comuns e meio banais, cuja origem remonta ao Fusca pré-II Guerra Mundial. Para os estudantes da indústria automobilística, no entanto, a Volkswagen é um gigante grupo industrial cujas vendas em 2011 chegaram a 8,1 milhões de unidades – por meio de nada menos que 10 marcas automobilísticas, e uma alta de 14% em 2010, apesar da crise econômica global – que provisoriamente levaram a companhia ao primeiro lugar no ranking das marcas mais valiosas, à frente de (uma revitalizada) General Motors e (uma ameaçada) Toyota. (Nota: as vendas excluem a Suzuki, que pertence 21% ao grupo alemão.)
“Em breve, recomendarei ao conselho [da Volkswagen] que expanda nossas atividades no automobilismo além das atuais categorias”, disse Durheimer à publicação “Wirschafts Woche”, o equivalente na Alemanha ao “The Economist”.
“Com base em nossa projeção de vendas na América, na Ásia e no Oriente Médio, não temos representantes suficientes no automobilismo [de lá], e na minha opinião, isto precisa ser sanado”, acrescentou o dirigente, antes de aludir à F1.
“[A F1] domina o cenário do automobilismo na Europa e na Ásia”, disse Durheimer, antes de concluir algo que muitos na F1 sabem muito bem: a categoria não está no radar norte-americano. “Precisamos olhar para Indy e Nascar.”
Recentes notícias erroneamente classificam o extravagante Durheimer, conhecido pelo gosto por ternos transpassados, abotoaduras, chamativos lenços de bolso e gravatas laranjas, como o “diretor esportivo” da Volks, mas esta é uma curta apresentação ao homem de 53 anos.
Resumindo: sim, o ex-diretor de desenvolvimento e pesquisa da Porsche que se sente à vontade pilotando Bugatti Veyrons a 300 km/h e detém total responsabilidade pelo programa de automobilismo da Volks (por exemplo, os motores fabricados para a F3 e o desenvolvimento do Polo R no WRC). Mas se Scania e MAN entrarem em categorias de caminhões ou a Seat se aventurar no Troféu Andros, campeonato de corrida no gelo, é a assinatura de Durheimer que endossaria tais campanhas.
Quem levantou o último título pelo ultra-bem-sucedido programa da Audi em Le Mans, ou o tetracampeonato na DTM? Ou o programa da Volks no Mundial de Rali – que começa de forma (muito) séria a partir de 2013 – e a equipe da Skoda no IRC? Ou o decisão da Porsche de voltar a La Sarthe e recuperar o posto de melhor do mundo nas tradicionais 24 Horas, algo que uma vez foi tão seu? Ou oelo departamento de competições da Lamborghini, pelas façanhas da Seat no Mundial de Turismo e, na verdade, a assinatura de qualquer programa de automobilismo que envolva as 11 marcas do grupo?
O próprio sr. WD. E ele acumula essas responsabilidades além dos “trabalhos diários” como presidente da Bentley Motors e da Bugatti, posição à qual foi elevado depois de uma carreira de 14 anos na Porsche, marca de carros esportivos assumida pela Volks e parceira do grupo alemão há mais de seis décadas. Lá o engenheiro graduado supervisionou, entre outros, o desenvolvimento de produtos como Carrera GT, Cayenne, Cayman e Panamera, e foi fundamental quando a empresa de Stuttgart decidiu entrar na American Le Mans com a Penske.
Um pouco ntes de aceitar o cargo em Zuffenhausen – distrito de Stuttgart que sedia a Porsche –, passou 12 anos na BMW, subindo na hierarquia da empresa bávara por meio de projetos para veículos de duas e quatro rodas, incluindo campanhas no Rally Dakar.
Em suma, comparando com Mercedes ou BMW, Durheimer não deve ser igualado a Norbert Haug ou o agora aposentado Mario Theissen (nem Jens Marquardt, seu substituto), mas sim seus respectivos chefes. Em segundo grau. Portanto, o sr. Durheimer não é nenhum tolo e, claramente, é um homem que tem o completo apoio dos diretores da Volks, visto de forma muito séria, independentemente dos comentários oficialmente atribuídos a ele.
Curiosamente, quando Durheimer declarou sua estratégia ao “Wirtschafts Woche”, aparentemente não se mostrou pressionado em definir qual marca seria a principal candidata a carregar o halo esportivo do grupo, e nem fez questão de ressaltar nenhuma –provavelmente esta omissão levou muitos a suporem que o disco azul da Volks entraria na F1, caso o conselho aprove sua recomendação.
Durheimer também não mencionou um período de tempo, embora duas datas tenham sido cogitadas, nomeadamente 2014 e 2018. Ambas fazem muito sentido de um ponto de vista temporal, principalmente se, como ele sugeriu, a Volks, a princípio, entre no esporte como fornecedora de motores e depois funde seu próprio time ao adquirir uma escuderia já existente (provavelmente a Toro Rosso, que, além de supostamente estar à venda, mantém uma parceria com a Volks como fornecedora de carros de rua). Assim, a Volks entraria na F1 não em uma ou outra temporada, mas em ambas...
Desde 2010, uma possível entrada da Volks na F1 tem sido cogitada – a primeira alusão foi em setembro por Michael Mauer, então chefe de Durheimer na Porsche. À época esta coluna sugeriu que a Audi, não a Porsche, seria a marca ideal para levar o grupo à F1, e a passagem do tempo tem, de qualquer modo, reforçado tal descoberta.
Tendo em conta as quatro montadoras presentes atualmente no esporte – Fiat/Ferrari, McLaren, Mercedes-Benz e Renault –, em várias capacidades, a Audi, do ponto de vista tecnológico e do marketing – que não apenas ligou vários nichos de mercado, como também criou novas opções –, é a única marca com a gama de produtos necessários para competir com as atuais fábricas no grid. E, se outras fabricantes aparecerem no esporte (uma vez que a modalidade resolva seus problemas comerciais), a Audi também terá produtos de rua para competir contra elas também.
Para provar isso, considere que, desde aquela coluna publicada em outubro de 2010, a Audi colocou no mercado os modelos A1 e A3, que compete diretamente com os bólidos homônimos da Renault e sua classe Infiniti (a mesma que patrocina a Red Bull), que as ofertas de médio e alto luxo atacam diretamente a Mercedes – a linha RS da Audi na AMG – e que os modelos de alta performance R8 provocam enormes incursões nos territórios de Ferrari e McLaren.
De fato, para comprovar esta afirmação, apenas note o parágrafo de abertura na principal matéria da revista “Autocar” desta semana. Referindo-se ao novo R8, que será lançado em 2014 (repare na data), a irmã da AUTOSPORT escreve:
A Audi planeja alçar firmemente a segunda geração do R8 à liderança do ranking dos carros de competição ao lado de Ferrari, Lamborghini (marca irmã que fornece boa parte da maquinaria ao R8) e Porsche (outra marca interna). Desta vez, o novo R8 trará algumas das técnicas de construção mais avançadas da Audi (entre elas, uma resina patenteada que mescla alumínio composto), engenharia de transmissão, aerodinâmica e eletrônica.
Posteriormente, a “Autocar” mostra que o R8 GT motor V10 de 5,2 litros e 580 cavalos de potência competirá diretamente contra o próximo 458 Scuderia da Ferrari e o 911 GT3 da Porsche. O McLaren MP4-12C com 592 cavalos de potência sequer é mencionado, nem o Mercedes SLS (563 cavalos de potência) da AMG, usado na F1 como carro de segurança. É ainda interessante notar que o R8 é alimentado por propulsores V10 e V8 – como foi usado na F1, respectivamente, de 1998 a 2005 e a partir de 2006 – enquanto os modelos RS6 e S8 andam com V10s, e o valor à vista dos atuais R8 V10 custa cerca de 60% dos carros listados acima...
Voltemos, porém, à linha do tempo: as datas de 2014 e 2018 serão significativas por razões regulamentares e comerciais. Em 2014, a F1 adotará propulsores turbo de 1.600cc “verdes”, o que significa que todos os fornecedores de motor terão de começar do zero. Há de ser dito que a estrutura do regulamento foi discutida após uma série de encontros do Engine Working Group, para os quais a Volks enviou um representante. A introdução foi proprrogada mais tarde para o início de 2014, colocando assim a F1 fora de sintonia com o atual Acordo de Concórdia, que expira no fim de 2012 e atualmente é tema de muita especulação/negociação.
Embora o regulamento tenha privilegiado as unidades de V6 à arquitetura de “quatro cilindros em linha” originalmente acordada para esta “nova aurora” da F1, isso, de qualquer modo, cai como uma luva nas mãos da Audi, cujos motores deste tipo de configuração já rodam no S4 e nos veículos a diesel.
As empresas de motores não estão vinculadas ao Acordo de Concórdia – e, neste momento, a nenhum Acordo de Restrição de Gastos –, o que deixa as portas abertas para a Volks entrar a qualquer momento como fornecedora para uma equipe já existente. Obviamente, não faz sentido que a empresa produza um V8 apenas para 2013, mas ela poderia entrar no esporte em qualquer momento depois de 2014 – ou por que não naquela temporada, quando todos os fornecedores provavelmente terão problemas no início?
Outro benefício de uma entrada em 2014 é que a Volks teria dois anos cheios para se preparar enquanto os atuais fornecedores, do ponto de vista operacional e financeiro, estariam ocupados em montar o suporte para seus programas com o V8 e desenvolver, ao mesmo tempo, seus novos V6.
Os Acordos de Concórdia geralmente perduram por blocos de cinco anos – à exceção do último, que durou uma década porque o detentor dos direitos comerciais da F1 Bernie Ecclestone quis prender as equipes em longos acordos depois de adquirir os direitos por uma ninharia aproveitando-se de sua relação com Max Mosley, então presidente da FIA e amigo de mais de 20 anos. Espera-se que o acordo de 2013 expire no fim de 2017, quando alguma forma de sucessão ou transparência deve entrar em vigor – até porque Ecclestone hoje tem 81 anos.
Corporações odeiam governos sujos. E tal modelo é regularmente atribuído por Ford, Honda, BMW e Toyota como um dos motivos pelo êxodo em massa do esporte.
Além disso, provavelmente, as equipes terão até lá uma participação conjunta de 80% na receita do esporte (acima dos atuais 50% e bem acima dos 23% pagos por Ecclestone entre 1998 e 2007). O rendimento bruto da F1 também deve duplicar e chegar a perto de 2 bilhões de dólares por ano e reduzir substancialmente o custo para as fábricas nas idas aos GPs.
Portanto, tudo se encaixa: a Volks fornece motores a uma equipe em uma base comercial por quatro anos a partir de 2014 enquanto aprende o básico de modo a ter um bode expiatório, assumindo a tutela completa de uma escuderia a partir de 2018. A única pergunta remanescente é: qual(is)?
A Volks tem laços de longa data com a Red Bull – não apenas a Toro Rosso usa produtos de rua da VW e a Red Bull o fez até a chegada da Infiniti, mas Seat e Audi se beneficiaram do patrocínio da Red Bull em seus respectivos programas no WTCC e no DTM.
A Red Bull deve deixar a Citroen para patrocinar o Polo R da Volks em 2013 e não é segredo que não apenas a Toro Rosso está à venda a um preço módico, como o acordo da Renault com a Red Bull termina no fim de 2016. O principal fator na trajetória da Red Bull, Sebastian Vettel, é o último superherói da Alemanha, então é simplesmente uma questão de juntar os pontos...
Fonte: tazio
Disponível no(a): http://tazio.uol.com.br
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